Por que a imprensa nacional dá mais espaço para o caso da ministra do Trabalho do que para o julgamento de Lula?

A posse da ministra é mais importante que o julgamento de Lula? (Fotos Antonio Cruz e Gustavo Lima/Agência Brasil).

Não precisa pegar uma régua e sair medindo o tamanho das noticias publicadas nos jornais e nos sites. Ou pegar um cronômetro e marcar o tempo das publicações nos noticiários de TVs, nas rádios e nos vídeos. Basta dar uma boa olhada, e salta aos olhos a superioridade dos espaços dedicados pela grande imprensa nacional às tentativas do governo federal em nomear para o cargo de ministra do Trabalho a deputada federal Cristiane Brasil (PTB – RJ). Em detrimento aos espaços das noticias relacionadas ao julgamento da apelação do ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT – SP), que acontecerá quarta-feira, na sede do  Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), em Porto Alegre.

O caso da deputada é exótico. Filha do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB – RJ), que ficou famoso quando denunciou o Mensalão do PT, ela tem uma divida trabalhista de R$ 60,4 mil com um ex-motorista da família e outros problemas pessoais. Esses problemas foram usados por um grupo de advogados para entrar na primeira instância da Justiça Federal  do Rio de Janeiro  com o pedido que ela não assumisse o cargo. Os advogados ganharam na primeira instância. O governo recorreu ao Superior Tribunal Federal (STF) e ganhou. Os advogados recorreram ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ganharam. Mas do caso ainda cabe recurso. Essa disputa já dura três semanas e ainda não tem prazo para terminar. Já que a insistência do governo na indicação é para contar com os votos do PTB na Reforma da Previdência. O caso de Lula vai decidir o perfil da disputa para presidente da República de 2018 e irá influenciar na economia do país, onde existem 13 milhões de desempregados. No ano passado, Lula foi condenado a 9 anos e seis meses por corrupção e lavagem de dinheiro pelo juiz de primeira instância da Justiça Federal Sérgio Moro, da Operação Lava Jato, em Curitiba (PR). Se o ex-presidente for condenado, não poderá concorrer nas próximas eleições. Ele ocupa o primeiro lugar nas pesquisas. E também poderá ser preso.

Esse é o cenário.  Dificilmente, o destino da deputada irá afetar o futuro do Brasil. Mas o de Lula, sim. Portanto, era de se esperar que as grandes empresas de comunicação dedicassem mais atenção em fornecer informações para os seus leitores sobre o caso. A cobertura atual do julgamento da apelação do Lula é burocrática, para dizer o mínimo. E por que isso acontece?  Na busca da explicação para essa pergunta, eu gostaria da atenção dos meus colegas, calejados e novatos. Em qualquer canto do mundo que exista liberdade de imprensa, nós, repórteres, sempre damos mais espaço para as notícias exóticas. Ainda mais hoje, quando disputamos cliques – visualização e compartilhamento das notícias na internet – com a concorrência. Há muito material na internet sobre o assunto.

Essa questão sempre me preocupou. Mas só levei a sério nas férias de 1998. Como é meu costume, antes de entrar em férias, vou a uma livraria e compro um livro grosso para ler. Na ocasião, a minha atenção foi chamada pelo título “Detonando a notícia – Como a mídia corrói a democracia americana”, escrito por James Fallows. Um livro muito legal. Em linhas gerais, o autor perguntava os motivos pelos quais quase 100% da atenção da imprensa dos Estados Unidos, durante o governo de Bill Clinton, estava voltado para o escândalo sexual que envolveu o presidente com a estagiária da Casa Branca Monica Samille Lewinsky, em detrimento das questões econômicas e estratégicas  do país. Por um bom tempo, eu refleti sobre o que tinha lido. Na época, lembrei que, quando comecei a trabalhar na redação da grande imprensa, no começo dos anos 80, o impacto das matérias exclusivas que se fazia era imenso. Com o tempo, esse impacto foi diminuindo. A explicação encontrada era que o aperfeiçoamento dos noticiários das TVs e do rádio estava tirando a relevância do jornal em papel. Os anos se passaram, os noticiários de TVs e rádios começaram a ter o mesmo problema: perdiam o impacto das suas matérias. Hoje, os sites têm o mesmo problema. Por que isso acontece? A resposta não é complexa. Acontece que o cotidiano do nosso leitor ficou complexo. E nós, repórteres, continuamos achando que ele é uma pessoa interessada no exótico. E não uma pessoa que precisa de informações precisas para decidir o futuro da sua família.  Essa é a explicação para a perda da relevância das nossas notícias.  É simples assim.

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