A fuga da deputada Zambelli e o destino dos presidenciáveis bolsonaristas

Ex-presidente continua sem definir a quem irá apoiar em 2026 Foto: Reprodução

Há uns dias estava comentando com um colega repórter sobre a pressão que a imprensa vem fazendo para que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), 70 anos, decida de uma vez por todas quem irá apoiar para substituí-lo na disputa eleitoral com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), 79 anos, que concorre à reeleição em 2026. Bolsonaro foi declarado inelegível até 2030 pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Na conversa, bati na tecla de que já existe entre os bolsonaristas a ideia de enfiar garganta abaixo do ex-presidente o nome do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), 49 anos, como candidato. Tarcísio foi ministro de Bolsonaro e ocupa um lugar de destaque entre os que pleiteiam a indicação do ex-presidente. Publicamente, tem dito que vai buscar a reeleição ao governo de São Paulo. Mas, nos bastidores, já está trabalhando na campanha presidencial. O meu colega não argumentou contra o que falei. Apenas me ouviu, e terminamos o papo falando de futebol. No início do mês, ele me ligou e perguntou: “Viu que deputada Zambelli fugiu do Brasil?”. Respondi que sim. Não tinha como não saber por ser manchete em todos os noticiários. Ele prosseguiu: “Viu, é isso que acontece com quem não segue as ordens do Bolsonaro. É abandonado à própria sorte”. E desligou o telefone.

Até certo ponto, ele tem razão. O governador de São Paulo não assumiu publicamente a sua candidatura por saber o que acontece com quem é abandonado pelo ex-presidente. Não se elege nem para síndico do prédio. No caso da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), ela não caiu em desgraça com os bolsonaristas por desafiar o ex-presidente. O caso foi outro. Às vésperas do segundo turno das eleições presidenciais de 2022, Bolsonaro, que concorria à reeleição, travava uma disputada acirrada contra Lula. E, na opinião dos analistas na época, seria um detalhe que elegeria o próximo presidente. Dentro deste clima, no centro da cidade de São Paulo aconteceu um episódio envolvendo a deputada. Alegando que tinha sido agredida pelo jornalista Luan Araújo, 34 anos, ela saiu correndo atrás dele de arma em punho, acompanhada pelos seus seguranças e assessores. Araújo invadiu uma lancheria para escapar da perseguição, onde foi imobilizado pela deputada e os seus seguranças. Todo o incidente foi filmado por câmeras de segurança e virou manchete nos principais noticiários. Lula ganhou as eleições, fez 50,88% dos votos válidos contra 49,12% de Bolsonaro. Uma pequena diferença de 2 milhões e uns quebrados de votos. Os bolsonaristas, em especial os três filhos parlamentares do ex-presidente – Carlos, 32 anos, vereador do Rio, Eduardo, 40 anos, deputado federal licenciado por São Paulo, e Flávio, 44 anos, senador pelo Rio de Janeiro – atribuíram a vitória de Lula ao episódio envolvendo Zambelli, que teria sido o tal “detalhe” que os analistas diziam que poderia definir a eleição.

As palavras dos filhos de Bolsonaro repercutiram na imprensa e a bronca foi atirada no colo de Zambelli, que foi banida do círculo pessoal do ex-presidente. A história de que a deputada foi culpada pela derrota do ex-presidente é uma tese sem comprovação. O fato é que Bolsonaro pisou na bola muitas vezes durante o seu mandato (2018 – 2022). Vou citar uma delas, que considero muito grave. A de ter transformado em política de governo o seu negacionismo em relação ao poder de contágio e letalidade do vírus da Covid-19, responsável pela pandemia que entre 2020 e 2021 matou milhões de pessoas ao redor do mundo e 770 mil no Brasil. As digitais do governo nas mortes dos brasileiros podem serem encontradas nas 1,3 mil páginas do relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito do Senado da Covid-19, a CPI da Covid. Vírus não tem partido político. Muitos bolsonaristas perderam parentes e amigos e simplesmente não votaram no ex-presidente. Conheci e conversei com muitas famílias bolsonaristas que ficaram indignadas com a resistência do então presidente em relação às vacinas. O fato é que Zambelli foi abandonada pelos bolsonaristas. Mas os crimes que ela cometeu para agradar o então presidente da República não a abandonaram. Bolsonaro defendia a ideia de que as urnas eletrônicas, bem como todo o sistema eleitoral brasileiro, não eram seguras. A deputada era presença constante no Palácio do Planalto, ajudando o presidente na conspiração contra o sistema eleitoral. Foi ela quem contratou o hacker Walter Delgatti, 36 anos, para ajudar na busca de provas de que as urnas eletrônicas não eram seguras. Entre os trabalhos prestados a Zambelli, o hacker invadiu o sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e publicou um mandado de prisão contra o ministro do STF Alexandre de Moraes, 56 anos. Por este crime, foi condenada no dia 15 de maio a 10 anos de prisão. Ela fugiu de carro para a Argentina, onde, usando o seu passaporte italiano (tem cidadania italiana), pegou um avião e viajou para os Estados Unidos, e de lá teria ido para a Itália. Assim que se tornou pública a fuga da deputada, a Procuradoria-Geral da República entrou no STF com um pedido de prisão preventiva, que na quarta-feira (4) foi decretada pelo ministro Moraes.

Moraes mandou a Polícia Federal pedir a inclusão do nome da parlamentar na lista de difusão vermelha da Interpol, o que aconteceu nesta quinta-feira (5), e decretou o bloqueio dos seus bens, incluindo a conta bancária onde é depositado o seu salário. O advogado da deputada, Daniel Bialski, informou ao STF a sua saída do caso. Trocando em miúdos: Zambelli está em uma grande enrascada. Para tentar se salvar, ela seguiu o roteiro do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL), que em março se licenciou por 122 dias do seu mandato e foi viver nos Estados Unidos, onde conspira contra os interesses brasileiros. Tratei do assunto no dia 27 de maio no post As intrigas de Eduardo Bolsonaro apoiam os rivais do Brasil nos negócios mundiais. A maneira como a imprensa tem noticiado a fuga da deputada faz parecer que ela seguirá o mesmo destino de Eduardo. São dois casos diferentes. O deputado licenciado não é fugitivo da Justiça, como é o caso de Zambelli, que foi condenada. Mais: ele está no ataque contra as instituições brasileiras. Um roteiro que a deputada terá dificuldades de seguir, por ser fugitiva da Justiça. Ela disse que pretende pedir licença do seu mandato. O destino de Zambelli ainda é incerto. Mas, seja qual for, ela estará sozinha.

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