Se o juiz federal Sérgio Moro, da Operação Lava Jato, não tiver uma carta na manga que demonstre que o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT – SP) é o proprietário do apartamento triplex, em Guarujá, no litoral paulista, uma acareação entre Lula e os delatores pode ser caminho que o juiz tomará no andamento do processo para esclarecer dúvidas. O processo tenta provar que o imóvel é uma propina recebida da empreiteira OAS pelo ex-presidente.
A importância dos delatores no processo pôde ser vista durante o interrogatório de Lula por Moro, no último dia 10, na 13º Vara da Justiça Federal, em Curitiba (PR). O conteúdo da maioria das perguntas feitas pelo juiz ao réu havia sido fornecido pelos delatores da Operação Lava Jato, a chamada prova testemunhal. Fora as delações, a investigação da força-tarefa forneceu pouco subsídio para o processo – provas técnicas. Ou seja: pelo que se sabe, os investigadores não conseguiram encontrar uma prova técnica que ligue Lula à posse do imóvel. Sem essa prova, fica a palavra do réu contra a dos delatores. E como um homicídio sem corpo, uma investigação muito difícil de encontrar provas contra o suspeito. Aqui chamo a atenção dos meus colegas repórteres, principalmente dos novatos. O juiz Moro pode condenar, em primeira instância, Lula no caso do triplex, baseado nas provas testemunhais. O nosso papel na história é mostrar as contradições do processo e da investigação feita pela força-tarefa da Lava Jato, que é coordenada pelo procurador da República Daltan Dallagnol. No ano passado, Dallagnol apresentou um PowerPoint mostrando que Lula era o coordenador do saque à Petrobras. Além de ter atropelado vários direitos do ex-presidente, a apresentação de Dallagnol foi um erro estratégico para a investigação do caso. Além dar informações preciosas para os investigados sobre o trabalho de apuração, a apresentação coloca uma dúvida sobre a credibilidade do que os delatores estão falando sobre o triplex. A impressão que dá é que estão preenchendo os pontos que faltam para ligar o Lula ao imóvel.
Esse episódio ainda está longe de terminar. Mas chamo a atenção dos estudantes de jornalismo. O que aconteceu durante o interrogatório de Lula por Moro – que está disponível na internet – é uma matéria-prima muito valiosa para quem pretende seguir a carreira de repórter. A expressão corporal dos dois, por exemplo. Com uma das mãos, Lula mexe em uns papéis. Moro insistia que era neutro. Lembro o seguinte: na maioria das vezes, o repórter é o cara que convence a falar a pessoa que não quer aparecer no jornal. Ou encontra quem não quer ser encontrado. E a tecnologia para fazer esse trabalho se aprende analisando episódios como o interrogatório.