Ao pedir a investigação da delação da JBS, Janot aposta na transparência

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, 60 anos, foi estratégico e se tornou o dono da sua história ao pedir investigações sobre a delação premiada feita pelos donos da JBS e seus executivos à Operação Lava Jato. O construtor da delação foi o próprio Janot. Ela causou um profundo impacto na vida do país, como o de encurralar o presidente da República, Michel Temer (PMDB – SP), o senador Aécio Neves (PSDB – MG) e outra centena de parlamentares.

As delações vieram a público em maio e caíram como se tivessem jogado uma bomba atômica em Brasília. Entrou na história do Brasil com a Lista de Janot, onde constam 107 parlamentares beneficiados com propinas pagas pelo grupo de empresários. Ela resultou em uma denúncia contra Temer. O presidente conseguiu se safar, manobrando os deputados da Câmara Federal, que não aprovaram a instalação do processo contra ele no Supremo Tribunal Federal (STF).

Se tivesse sido aprovado, o presidente da República seria afastado do cargo por 180 dias. Uma nova denúncia vem por aí.  O senador Aécio ficou afastado do cargo 45 dias, e a sua irmã, a jornalista Andrea Neves, esteve presa durante um mês. Temer, Aécio Neves e seus aliados abriram fogo contra Janot, denunciando os generosos benefícios conseguidos pelos donos da JBS e seus executivos com a delação, entre eles saíram do país em jatinho particular rumo aos Estado Unidos levando na bagagem a imunidade dos crimes cometidos.

Se a investigação pedida por Janot apurar que houve dolo dos delatores, omitindo provas durante a delação premiada, eles podem perder os benefícios. Mas as provas que já forneceram continuam valendo.  O cerne da investigação é o material entregue pelos delatores na semana passada à Procuradoria-Geral da República (PGR). No que foi entregue, os técnicos da Polícia Federal (PF) encontraram conversas de Joesley Batista, um dos donos da JBS, e seu ex-executivo Ricardo Saud, que incriminam o ex-procurador da República Marcelo Miller, que teria auxiliado o empresário enquanto trabalhava com Janot.

Esses são os fatos. Convido os meus colegas repórteres, especialmente os novatos, a se concentrarem nas entrelinhas do acontecimento. Vejamos. A sucessora de Janot, Raquel Dodge, que assume no próximo dia 17, já tinha falado, de maneira genérica, que a delação da JBS poderia ser revista. Some-se a isso o fato de que, há muito tempo, Temer e Aécio vêm denunciando o ex-procurador Miller de ter auxiliado os delatores e de ter jogado do lado deles enquanto trabalhava com Janot.

Frente a esses fatos, o raciocínio lógico é que Janot pediu a investigação como uma espécie de habeas corpus para o caso de ser acusado de, no mínimo, ter sido ingênuo no acordo feito com a JBS. Antes de seguir contando a história do Janot, eu quero refletir com os meus colegas repórteres, especialmente os novatos na lida reporteira. Lembro que, quando entrei para trabalhar em redação de jornal, em 1979, uma das primeiras afirmações que ouvi era que jornalista não errava. Vários entrevistados ligavam para as redações apontando incorreções nas matérias. Ninguém dava bola. Azar da vítima. No final dos anos 80, as redações do Brasil começaram a mudar e admitir o erro. A mudança não aconteceu devido a um processo de autocrítica dos repórteres. A mudança aconteceu por pressão dos departamentos jurídicos dos jornais, devido à chuva de processos contra jornalistas. Hoje, todos os grandes jornais e noticiários do país têm a coluna Erramos. Por mais eficientes que sejam os processos de checagem de informações das redações, a possibilidade de passar um erro é real. A Escola de Base (1994) está aí para provar – foi o maior erro jornalístico do Brasil. e há material disponível na internet. Admitir o erro fortalece o bom jornalismo.

Voltamos ao caso de Janot. Um dos efeitos da Operação Lava Jato foi cunhar na cabeça dos brasileiros que ninguém está acima da lei. Isso inclui o Poder Judiciário do Brasil. Dentro dessa nova regra, todos devem prestar contas, incluindo a admissão dos erros. Portanto, ao instalar a investigação sobre a delação premiada da JBS, que foi o seu maior feito na PGR, Janot deixa como legado da sua administração a transparência do trabalho dos procuradores. Se houve erros, eles serão corrigidos, e não varridos para baixo do tapete. Com isso, a PGR se afasta do mundo coberto de sombras habitado por Temer, Aécio e tantos outros parlamentares. Como repórteres, nós temos que sempre ficar com um pé atrás. No caso, não se sabe as particularidades da disputa política dentro da PGR. Vamos saber com o andar da carroça, com diz o jargão das redações.

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