As intrigas de Eduardo Bolsonaro apoiam os rivais do Brasil nos negócios mundiais

STF abriu um inquérito para investigar o deputado licenciado Foto: Reprodução

Nos finais de semana costumo conversar com colegas repórteres que conheci e fiz amizade durante as coberturas de conflitos agrários nas décadas de 80 e 90. Muitos continuam na ativa, escrevendo livros, artigos e observando o cotidiano da política nacional. Um deles me chamou a atenção para o seguinte fato, que vou descrever para facilitar o entendimento da conversa que tive com o colega. Não passa uma semana sem que vire manchete nos jornais uma das intrigas sobre o Brasil feitas ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump (republicanos), 78 anos, pelo deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), 40 anos. Os alvos prediletos do deputado licenciado são o ministro Alexandre de Moraes, 56 anos, do Supremo Tribunal Federal (STF), e o procurador-geral da República, Paulo Gonet, 63 anos. Eduardo é o terceiro filho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), 70 anos. Em 20 de março passado, ele se licenciou do seu mandato por 122 dias e mudou-se com a família para o Texas. Na ocasião, justificou a mudança de endereço dizendo que o objetivo era se dedicar a convencer os secretários (ministros) e outros funcionários de confiança de Trump a pressionarem o governo do Brasil a anistiar os envolvidos nos ataques de 8 de janeiro de 2023 ao Congresso, ao Palácio do Planalto e ao STF. E também recomendar a adoção, pelos americanos, de sanções contra o ministro Moraes e o procurador-geral Gonet, os quais acusa de perseguirem a sua família.

Nesta segunda-feira (26) foi acrescentado mais um capítulo ao histórico de acusações do deputado licenciado contra Moraes e Gonet sobre o qual falarei no final da nossa conversa. A respeito da cobertura sobre este episódio perguntei ao meu amigo qual era a novidade. Ele respondeu: “Os colegas não têm lembrado, nas suas matérias, que estas intrigas servem de munição para os concorrentes comerciais do Brasil nos mercados mundiais, principalmente no agronegócio”. Por conta da provocação, li com cuidado várias reportagens sobre as denúncias do deputado licenciado. Realmente, o foco da imprensa tem sido a questão da disputa política entre os bolsonaristas, o STF e os aliados do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), 79 anos. Pouco tem se escrito a respeito da influência das intrigas de Eduardo sobre os negócios do Brasil nos mercados internacionais. Há uma pergunta que precisa ser feita ao deputado. Boa parte do agronegócio forma a base eleitoral do seu pai. Por que então ele está esticando a corda? Perguntei a um analista político com quem tenho longas conversas quando preciso entender algumas situações complicadas. Ele lembrou que a extrema direita brasileira, que tem a família do ex-presidente como um dos seus esteios, construiu uma narrativa política seguindo a trilha deixada pela esquerda durante a ditadura militar (1964 a 1985). Na época, os militantes que viviam exilados em vários países ao redor do mundo procuravam as redações dos jornais, pessoas influentes nos governos locais e defensores da democracia para denunciar os abusos (torturas, censura e prisões ilegais) cometidos pelo regime militar.

Estas denúncias acabavam virando pauta em importantes jornais estrangeiros e seguidamente em sanções dos governos contra os militares que mandavam no Brasil. Os bolsonaristas estão fazendo a mesma coisa. Porém, existe uma diferença fundamental. Nos dias atuais, o Brasil vive uma democracia, que foi consolidada com a Constituição de 1988. A imprensa é livre, o cidadão tem assegurado os seus direitos fundamentais e as eleições são livres e seguras. O que torna as denúncias do deputado licenciado uma mentira. Se estas mentiras fossem contadas uma década atrás, a possibilidade do seu autor ser chamado de mentiroso pela imprensa mundial era enorme. Hoje, elas se somam a mais uma das que viraram armas na disputa política devido o avanço da extrema direita. Lembro que Trump se elegeu em 2024 sendo acusado pelo presidente dos Estados Unidos da época, Joe Biden (democrata), 82 anos, de mentiroso. Aliás, em 2016, quando concorreu e ganhou o seu primeiro mandato (2027 a 2021), Trump já usava abundantemente a mentira como instrumento na campanha eleitoral. Bolsonaro seguiu o mesmo caminho em 2018, quando foi eleito presidente da República. Aqui, uma curiosidade. De 2020 a 2023 foi declarada a pandemia de Covid. Trump foi um negacionista em relação à letalidade e ao poder de contágio do vírus e usou fake news para propagar as suas ideias sobre a doença. O que resultou na morte por Covid de 1,2 milhão de americanos. No Brasil, o então presidente Bolsonaro seguiu na mesma linha negacionista sobre a pandemia. O relatório final de 1,3 mil páginas da Comissão Parlamentar de Inquérito do Senado sobre a Covid-19, a CPI da Covid, colocou as digitais do governo federal nas 700 mil mortes de brasileiros pelos vírus. O negacionismo de Trump contribuiu para a sua derrota em 2020, quando concorreu à reeleição contra Biden. Destino semelhante teve Bolsonaro em 2022, quando perdeu para Lula. Durante a pandemia, por mais bem elaborada que fosse a mentira, não havia como competir com as imagens nos noticiários das TVs e nas redes sociais de centenas de mortos pelo vírus sendo enterrados em covas coletivas nos cemitérios.

Passado o episódio da pandemia, a vida voltou ao normal e as mentiras retornaram com força total ao jogo político. Na Argentina, no final de 2023, se elegeu presidente da República Javier Milei, 54 anos, da extrema direita, que usou e abusou de fake news durante a campanha. No Brasil, à medida que as investigações da PF avançavam para esclarecer quem era os mandantes, os financiadores e a massa de manobra na tentativa de golpe de estado que se iniciou no final de 2022 e teve o seu auge no 8 de janeiro de 2023, se intensificou o uso da mentira nas redes sociais pelos seguidores do ex-presidente. É opinião de muitos analistas políticos que hoje a política vive o auge do uso de fake news. É dentro desta realidade que devemos analisar os movimentos que estão sendo feitos por Eduardo Bolsonaro nos Estados Unidos. Pelo que temos publicado, ele tem tido um relativo sucesso, porque avançam pressões do governo dos Estados Unidos sobre o ministro Moraes e procurador-geral da República Gonet, que são acusados de não respeitarem os direitos humanos. O momento da política americana é complicado. Os primeiros 100 dias do governo Trump, que começou em 20 de janeiro, mostraram que não é possível prever o que irá acontecer no dia seguinte na Casa Branca. Tal é a velocidade das confusões armadas mundo afora pela atual administração, como o tarifaço de parceiros e adversários comerciais dos americanos, que espalhou desordem na economia mundial. Predomina um “salve-se quem puder” no comércio global. O deputado licenciado é o terceiro filho do ex-presidente, formado em direito e escrivão da Polícia Federal (PF). Portanto, é um dos mais bem preparados da família na disputa eleitoral. Sabe que o Brasil não é uma “República de Bananas” e que as mentiras que vem espalhando pelos quatro cantos do mundo podem acabar complicando a sua vida. Aqui vou comentar o capítulo acrescentado a esta história na tarde de segunda-feira (26). Moraes, a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), abriu um inquérito contra Eduardo Bolsonaro para apurar três crimes: prática de coação no curso do processo, obstrução de investigação de infração penal e abolição do estado de direito. Por estar financiando a estadia de Eduardo nos Estados Unidos, o ex-presidente Bolsonaro foi chamado para dar explicações ao ministro Moraes. A história do processo é o próximo capítulo desta história. Por sinal, promete muitas emoções.

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