A cúpula do movimento bolsonarista ainda não entendeu a situação. O empresário bilionário nascido na África do Sul e naturalizado americano Elon Musk, 52 anos, não vai usar o seu prestígio e muito menos os seus recursos para salvar a pele do ex-presidente da República Jair Bolsonaro (PL) nos processos aos quais responde nos inquéritos presididos pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, 55 anos. Musk está usando os rolos de Bolsonaro com o STF para pressionar o ministro contra a regulamentação das redes sociais no Brasil – matérias na internet. Não é Musk que serve a Bolsonaro, é o ex-presidente que serve aos propósitos do empresário bilionário. Fiz essa afirmação com base em tudo que li e assisti a respeito da manifestação feita no domingo (21/4), em Copacabana, no Rio de Janeiro (RJ), que reuniu 32 mil pessoas. A exemplo do ato que aconteceu em 25 de fevereiro, reunindo 182 mil bolsonaristas na Avenida Paulista, centro de São Paulo, o do Rio também foi organizado, financiado e articulado pelo pastor neopentecostal Silas Malafaia, da Igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo.
Não vou comparar a grandiosidade dos dois atos. Considero essa conversa assunto para a imprensa diária. A nossa conversa é sobre a cúpula do movimento bolsonarista. O ato do Rio pegou carona no tumulto criado pelos ataques do empresário ao ministro Moraes. Falei sobre o assunto no post de 12 de abril Musk amarrou o cavalo no lugar errado, o Brasil não é uma república de bananas. De certa maneira, fiquei surpreso pela manifestação ter apostado tão alto na história da briga do empresário e do ministro, já que o caso saiu das manchetes para o pé da página dos jornais. Eles teriam outra opção de aposta? Não. O ex-presidente e toda a cúpula do movimento, incluindo o presidente do partido de Bolsonaro, Valdemar da Costa Neto, estão respondendo a muitos inquéritos e processos no STF. Portanto, estão terceirizando os ataques ao ministro Moraes. No domingo, ficaram a cargo do pastor Malafaia. Ele é defensor do atrelamento da luta dos bolsonaristas contra o ministro Moraes à de Musk. Mas não é unanimidade dentro do movimento. Muito pelo contrário. Há lideranças importantes que não estão gostando dessa proximidade, por julgar que o episódio é uma briga de cachorro grande e, por isso, no final pode sobrar para o lado mais frágil. Um dos defensores dessa visão é o presidente do PL. Costa Neto, 74 anos, é um político muito experiente. Na opinião dele, quanto mais longe o ex-presidente ficar da briga de Musk com Moraes, melhor para todo mundo. Prega que Bolsonaro deve se concentrar em investir o seu capital político nas eleições municipais e conseguir eleger o maior número possível de vereadores e prefeitos. Acredita que esse seja o caminho para o ex-presidente se safar da condenação que mais o incomoda, que é a inelegibilidade de oito anos aplicada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Malafaia é defensor da tese de que, para Bolsonaro derrubar essa condenação, deve criar “movimentos monstros”, reuniões com grande número de seguidores, para pressionar o TSE.
Há mais um fator que deve ser levado em conta. A campanha presidencial nos Estados Unidos começa a ganhar corpo. O ex-presidente Donald Trump (republicano) vai disputar as eleições de novembro com o atual, Joe Biden (democrata), que o derrotou em 2020. Tudo indica que será uma disputa muito acirrada. Dentro de um ambiente de disputa acirrada, duvido que republicanos e democratas terão tempo para se preocupar com qualquer coisa que não seja os seus próprios problemas. Portanto, é ilusão dos bolsonaristas acreditarem que poderão contar com a atenção dos seus aliados da extrema direita americana, ligados a Trump. Será um deus nos acuda. Cada um por si. O que descrevi é a realidade. Mas para a militância é vendida a ideia de que a ajuda da extrema direita internacional está chegando. É absurda essa história. Mas é assim que está sendo contada para o militante. Confesso que fiz parte do grupo de jornalistas que acreditava que o ex-presidente não gastaria tempo, dinheiro e esforço físico tentando derrubar a decisão do TSE. Até porque há, em um estado bem adiantado, uma disputa interna no movimento bolsonarista sobre quem irá substituí-lo nas eleições presidenciais de 2026. Mas estava enganado. Bolsonaro realmente foi convencido que tem alguma chance de derrubar a sentença. Não tem. A situação do ex-presidente perante a lei é muito complicada. Até onde ele está disposto a apostar na possibilidade de derrubar a sentença do TSE, eu creio que só o tempo nos dirá.
A exemplo do que acontece nos países democráticos ao redor do mundo, o cenário político muda diariamente no Brasil. Especialmente em anos de eleições municipais, que são a disputa mais renhida do calendário eleitoral. Ninguém tem dúvida, inclusive os seus adversários, que o ex-presidente elegerá muita gente para as câmaras municipais e prefeituras. E que dessa eleição brotará uma nova realidade política. É assim que as coisas funcionam. Agora, qual será o rumo que essa nova realidade política dará ao movimento bolsonarista? Não tem como imaginar, por existirem muitas variáveis soltas no ar. Uma delas é que há no movimento um grupo considerável de pessoas ligadas à chamada direita democrática que aguarda com ansiedade o surgimento de uma nova liderança ligado ao centro. Nos últimos tempos, a imprensa esqueceu da existência desse grupo. Mas ele continua existindo.