A imprensa não está atenta à disputa de poder dentro do Partido Liberal (PL) entre os seguidores do ex-presidente da República Jair Bolsonaro e o presidente da sigla, Valdemar Costa Neto, 73 anos, um dos mais experientes e astutos políticos do Brasil. Costa Neto não esconde a sua irritação com as ações radicais dos chamados bolsonarista raiz e os seguidores do ex-presidente deixam público o descontentamento com a moderação do presidente do PL, em especial com os seus laços de amizade com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Lembremos que Bolsonaro entrou o PL no auge da sua popularidade e poder, depois de fracassar na tentativa de fundar o partido Aliança pelo Brasil. Não conseguiu as 500 mil assinaturas necessárias para erguer o partido. E que foi graças ao prestígio político dele que o PL tem hoje a maior bancada do Congresso (99 deputados federais e 14 senadores). Mas Bolsonaro não pode dizer que o partido é dele, como tentou dizer, quando era presidente, que o Exército era seu. O partido é de Costa Neto e as regras são as deles. Não é por outro motivo que ex-presidente tem seguido as determinações do partido de usar a moderação nas suas manifestações públicas.
Antes de seguir a nossa conversa vou dar uma explicação que considero necessária para os meus colegas repórteres e os leitores. Em nome do bom jornalismo é sempre bom informar o leitor de onde tiramos as informações. O que vou escrever não é opinião. Vou relatar fatos que consegui na leitura atenta ao que temos publicado nos noticiários, em informações encontradas nas entrelinhas das nossas matérias e nas apurações que fiz conversando com fontes sobre a relação entre Costa Neto e os bolsonarista raiz. Voltando a nossa conversa. Todas as semanas explode um rolo no colo do ex-presidente. Isso não é novidade para Bolsonaro. Durante as quase quatro décadas em que foi parlamentar (deputado federal e vereador no Rio de Janeiro), ele respondeu a muitas ações na Justiça por ter transgredido a lei, como em 1999, quando defendeu uma guerra civil para matar 30 mil adversários políticos, fazendo o trabalho que a ditadura militar (1964 a 1985) não fez – há dezenas de outros casos publicados na internet. A estratégia de Bolsonaro era tirar proveito político da confusão e depois ficar quieto num canto até que as redações dos jornais esquecessem o assunto. Agora não é mais assim, porque os rolos em que o ex-presidente se meteu são nacionais e muito sérios, grandes demais, portanto, para serem esquecidos. Cito o maior de todos: o 8 de janeiro, quando bolsonaristas radicalizados quebraram tudo que encontraram pela frente no Congresso, no Palácio do Planalto e no Supremo Tribunal Federal (STF). O último que explodiu no colo do ex-presidente foi a arrecadação por Pix de R$ 17 milhões entre os seus seguidores para pagar multas na Justiça – há material disponível na internet. E há outros na fila de espera, como é o caso das 1,3 mil páginas do relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito do Senado sobre a Covid-19 (CPI da Covid), que colocou as digitais do governo da época na morte de 700 mil brasileiros. Esses rolos todos estão drenando o prestígio político do ex-presidente junto aos eleitores da direita tradicional e os independentes que decidem na última hora em quem vão votar. Como parar essa sangria política?
Para isso há várias soluções sendo discutidas pelos bolsonaristas raiz e pelas lideranças que fizeram parte do círculo íntimo que gravitava ao redor do ex-presidente. O ponto comum entre as soluções estudadas é partir para o contra-ataque. E a mais encorpada no momento é tomar o poder de Costa Neto e transformar o PL em uma espécie de plataforma de lançamento da contraofensiva para defender o ex-presidente perante a opinião pública. E ser também uma pedra no sapato do presidente Lula no Congresso. Vou resumir uma longa conversa que tive com uma fonte sobre a disputa pelo poder no PL. “Bolsonaro tornou o PL um partido grande. Portanto, tem o direito de usar a estrutura partidária para dar a sua versão sobre os fatos”. Argumentei que ex-presidente tinha sido declarado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por oito anos e que, consequentemente, estava foro do jogo eleitoral. Respondeu: “Este é outro assunto. O que é mais urgente é contra-atacar na opinião pública. Os adversários sabem que Bolsonaro vai eleger muitos prefeitos e vereadores e estão tentando destruir a imagem dele”. Costa Neto não é um inexperiente no jogo político, fui lembrado por uma fonte. Ele sabe que o destino político de Bolsonaro será decidido nas eleições municipais. Se ele conseguir eleger prefeitos de cidades importantes, como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, por exemplo, Costa Neto perde o seu partido para os bolsonaristas. Se a atuação do ex-presidente nas eleições municipais for discreta, os bolsonaristas raiz do PL vão ter que engolir Costa Neto ou mudar de partido.
Aos repórteres, em especial aos colegas que estão iniciando a carreira de comentarista político, lembro que durante o governo Bolsonaro (2019 a 2022) aprendemos que ele e os que o rodeiam decidem as coisas no dia levando em consideração o ambiente político daquele momento. Ou seja, não existe um planejamento. É tudo decidido na hora. E qual é o momento atual? Preservar o poder de Bolsonaro de eleger candidatos nas eleições municipais. O que acontecerá no dia seguinte às eleições é outro assunto. A não ser que aconteça uma negociação entre os bolsonaristas raiz e Costa Neto, eles vão tentar derrubá-lo. Essa é a realidade de hoje (1º de agosto).