O ministro da Saúde, general da ativa do Exército Eduardo Pazuello, é apontado nos quatro cantos do Brasil como símbolo de incompetência administrativa, mentiroso e “pau mandado” do presidente da República Jair Bolsonaro (sem partido) para fazer o serviço sujo na defesa do negacionismo em relação à pandemia da Covid-19. Por conta disso, ele está com os nervos à flor da pele e disparando chumbo grosso contra a imprensa. Ou seja: tenta matar o mensageiro. O problema de Pazuello não é ser demitido do cargo de ministro. Mas, no futuro, ser processado pela Corte Internacional de Justiça como executor da política genocida de Bolsonaro em relação à Covid. As imagens de pacientes asfixiados pela falta de oxigênio nos hospitais em Manaus (AM) estão correndo o mundo. E alguém vai pagar por isso? Existem duas digitais nesse caso: a dele e a do presidente. É sobre isso que vou conversar com os meus colegas.
Vamos aos fatos. Em razão da pandemia e da política negacionista do presidente em relação à letalidade do vírus, a cadeira do Ministério da Saúde é uma “chapa quente”, expressão cunhada nas redações dos tempos das máquinas de escrever para descrever um cargo de alta rotatividade. Por ali já passaram os médicos Luiz Henrique Mandetta, demitido por Bolsonaro por seguir a ciência no caso do vírus, e Nelson Teich, que pediu as contas por não concordar com as posições exóticas do governo referente às estratégias para combater a Covid-19. O general foi colocado na Saúde para executar as ordens do presidente. E quais foram as ordens? Consolidar como política de governo o negacionismo quanto à letalidade do coronavírus e pregar o uso de medicações, tipo cloroquina, como tratamento preventivo, contrariando as melhores mentes científicas do mundo, que afirmam que a droga não tem efeito contra a Covid.
Resumindo. Pazuello consolidou como política de governo o negacionismo de Bolsonaro. E o que aconteceu em Manaus é consequência dessa política. Isso é um fato. Lembro que logo que o general foi oficializado como titular da Saúde, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) lembraram que ele, por ser oficial da ativa do Exército, poderia se complicar no futuro com a Justiça por executar a política genocida do governo. Aqui chegamos a um ponto da nossa conversa em que eu gostaria de fazer uma observação aos colegas, principalmente aos jovens repórteres envolvidos na correria das redações. Não é uma opinião. Vou relatar fatos que já publicamos, acrescentando algumas informações obtidas em “conversas ao pé do ouvido” com fontes. Pazuello faz parte de um contingente que hoje soma mais de 6 mil militares da ativa, da reserva e reformados que ingressaram no governo sob a alegação de “competência e lealdade com os interesses nacionais”. No primeiro ano descobriram que estavam ali para obedecer as ordens de Bolsonaro, capitão reformado do Exército, que tem como grande plano de governo proteger a sua família. Alguns deles saíram, como o general Carlos Alberto Santos e outros, por se sentirem desprestigiados e humilhados. A grande maioria ficou. Pelo salário.
De todos os generais que ocupam cargos no governo, Pazuello é o que tem o maior problema nas mãos. Por quê? O vírus continua empilhando cadáveres, já são mais de 200 mil mortos.
Aqui e ali tem vazado para a imprensa que o presidente está descontente com o trabalho de Pazuello. Descontente? Mas o general faz tudo o que ele manda. Pois é. Mas as posições do presidente em relação à Covid não são só absurdas, elas beiram à ilegalidade, como é o caso de Manaus. Bolsonaro demitindo o general ganha tempo para tentar recompor a sua imagem política. Pazuello é general da ativa e se for demitido volta para o quartel. Não li em parte nenhuma, que eu me lembre, qualquer declaração do ministro referente a sua permanência ou não no governo. Mas alguns sinais podem ser notados. Por exemplo, durante a entrevista coletiva de lançamento da vacina pelo governador de São Paulo, João Doria (PSDB-SP), adversário político do presidente, Pazuello dava sinais claros da sua irritação. Tanto que trocou palavras ásperas com um senhor que estava arrumando os microfones na mesa. Em reuniões com governadores e secretários estaduais da Saúde ele tem se mostrado arrogante. Na semana passada, falou que os secretários deviam prestar atenção ao que ele dizia e não ao que a imprensa escrevia. No fim de semana, na ocasião do início da campanha de vacinação pelo governador de São Paulo, o general foi chamado de mentiroso, entre outras coisas.
Enquanto todos atiram pedras no general, o presidente faz de conta que não é com ele. E se fala alguma coisa é para lembrar que ele resolveu um problema que não fora resolvido, como no caso da falta de oxigênio nos hospitais de Manaus. Lembro o seguinte. Quando um técnico de futebol está desprestigiado perante a torcida, o dirigente do clube vem a público dizer ele está garantido no emprego. Está nada. O dirigente está só esperando a melhor hora para se livrar do problema. Bolsonaro ainda não veio a público elogiar Pazuello. Mas uma coisa nós repórteres aprendemos sobre o presidente da República nos seus dois anos de governo. Ele tem sempre um boi de piranha para levar a culpa. A expressão boi de piranha é muito usada no Pantanal do Mato Grosso, onde os rios são infestados pelos cardumes desses peixes vorazes. Para atravessá-los, os vaqueiros fazem um boi velho atravessar antes para atrair as piranhas e deixar o restante do rebanho em paz. Claro, o general conhece a história do boi de piranha.