Nós, repórteres, não damos muita atenção para o assunto. Mas muitas pessoas anônimas que colocamos nas nossas reportagens acabam se embriagando pela popularidade momentânea e se tornam caçadoras dos 15 minutos de fama. Nas últimas duas décadas, surgiram e se consolidaram no mercado profissionais que orientam a carreira dessas pessoas. O procurador da República Wellington Divino de Oliveira, da Procuradoria Geral da República (PGR) de Brasília (DF), se encaixa no perfil de caçador dos 15 minutos de fama. Foi por essa razão que ele encaixou o jornalista americano Glenn Greenwald na denúncia dos seis hackers que invadiram os celulares de autoridades, entre eles Sergio Moro, ex-juiz federal e atual ministro da Justiça e Segurança Pública, e do coordenador da Força-Tarefa da Operação Lava Jato, o procurador da República Deltan Dallagnol. Vamos aos fatos.
O procurador Wellington acusa Glenn de ter colaborado com os hackers. Uma investigação da Polícia Federal (PF) não encontrou essa ligação. Uma liminar do Supremo Tribunal Federal proíbe o jornalista de ser investigado. E acima de tudo isso está a Constituição do Brasil, que garante o sigilo da fonte. Glenn é o criador do site The Intercept Brasil, que tem publicado diálogos entre os procuradores da Lava Jato com o então juiz Moro, quando este era titular da 13ª Vara Federal de Curitiba (PR). Os diálogos, mantidos por meio do aplicativo Telegram, foram entregues ao site por uma fonte que o jornalista se reserva o direito de não revelar. A publicação colocou contra a parede a imparcialidade do julgamento dos réus da Lava Jato, incluindo o caso do ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT-SP). Ele foi condenado por Moro, que depois se tornou ministro do presidente Jair Bolsonaro (sem partido – RJ). Em 2013, Glenn encurralou o governo dos Estados Unidos. Escreveu uma reportagem sobre Edward Snowden, ex-funcionário da CIA, que denunciou um programa secreto de vigilância global americano. O trabalho resultou no documentário chamado Citizenfour, foi premiado com um Oscar e um Pulitzer (o mais importante prêmio da imprensa americana) e tornou Glenn personagem de um filme de Oliver Stone, Snowden – herói ou traidor.
O currículo de Glenn o tornou um alvo fantástico para os caçadores dos 15 minutos de fama. O procurador Wellington está surfando na fama do jornalista. Não é por outro motivo que ele o denunciou por crimes que a PF diz que não existiram e ignorando uma liminar do STF que impede a investigação do caso por se tratar de sigilo da fonte. Wellington é reincidente. Já havia surfado na fama do então presidente Lula (2003 a 2011), quando, em 2007, o acusou de desvio de recursos do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen). Em 2016, no auge da Lava Jato, o procurador voltou a acusar Lula, daquela vez por ter se apropriado de um crucifixo. Claro que as duas acusações não deram em nada. Mas lhe renderam os tais 15 minutos de fama. Assim como no caso do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, a quem acusou de injúria por ter se posicionado contra Moro. Sou um velho repórter estradeiro que já viu coisas neste mundo que até Deus duvida que existam. Tenho 69 anos, 40 de profissão e um currículo nutrido que me autoriza a chamar a atenção dos meus jovens colegas de profissão e daqueles que ainda estão nas faculdades.
Nas reportagens sobre o procurador, nós temos escrito nas entrelinhas que sua atitude deve-se ao fato de ter sido sargento do Exército e ser amigo do ministro Moro. Ele não age por ideologia ou por solidariedade. O que ele vai fazer se conseguir chegar lá, ninguém sabe. Creio que nem ele. Vou lembrar uma coisa. Nas últimas três décadas havia um parlamentar do chamado baixo clero da Câmara Federal que só conseguia aparecer nos jornais quando dizia uma grande bobagem, tipo exaltar torturadores da ditadura militar (1964 a 1985), uma tese tão exótica que acabava em manchete de jornal. Hoje ele é presidente da República, Jair Bolsonaro. O criador da expressão 15 minutos de fama e o pai do “pop art” Andy Warhol (falecido em 1987). Ela diz o seguinte: assim: No futuro todos serão famosos durante quinze minutos. Nas redações foi reduzida para: “quinze minutos de fama”. A escuto desde que comecei trabalhar como repórter. É do jogo as pessoas quererem nos usar para aparecer. Não é do jogo fazerem isso prejudicando outras pessoas ou pisando na lei. Mesmo que seja um homem da lei, com é o caso do procurador Wellington.
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