A história que contam os amigos, conhecidos, parentes e o marido, o advogado Pedro Melo Ribas, 32 anos, é que a dentista Bárbara Machado Padilha, 32 anos, saiu de casa no final da tarde de sábado (10/10) e nunca mais foi vista. A família mora em Tupanciretã, uma pequena cidade agrícola de 22 mil habitantes no interior do Rio Grande do Sul. O que a Polícia Civil já sabe é que ela pegou um táxi, rodou 50 quilômetros pela BR-158 até Santa Maria, desceu no Posto Castelinho, que fica na periferia da cidade, comprou um picolé na loja de conveniência e desapareceu. A investigação policial rastreou a presença do celular dela nas imediações do posto onde foi encontrada uma pegada na grama que pode ser dela. Nos meus 40 e poucos anos como repórter, já trabalhei em vários casos semelhantes a esse. E aprendi que é do tipo que mais faz a família sofrer. O trabalho policial é dividido em duas partes: a primeira é encontrá-la. E cada segundo, minuto, hora e dia que passam tornam a busca mais desesperadora. A segunda parte vem depois de encontrá-la, que é saber o que, como e por que aconteceu.
Qual é o nosso papel nessa história? Gostaria de trocar umas ideias sobre o assunto, principalmente com os repórteres jovens que estão na correria das redações cumprindo meia dúzia de pautas por dia. O repórter deve ficar atento a tudo que achar estranho. E não divulgar nada que não tenha sido verificado para saber se é verdadeiro. Esse tipo de caso é muito difícil de trabalhar porque, à medida que o tempo avança sem uma solução, começam a brotar as “histórias fantásticas”. Lembro-me de um caso que foi resolvido na noite de 4 para 5 de outubro de 2011. A história começou no dia 19 setembro, uma segunda-feira, com o desaparecimento da jovem Luane Chaves Lemes, 23 anos,em Passo Fundo, soldado do 3º Regimento de Polícia Montada – os antigos Abas Largas, da Brigada Militar (BM). Uma semana antes de sumir, Luane brigou com o namorado em uma boate. No dia do desaparecimento a última pessoa que a viu foi o dono de um açougue na esquina da rua onde ela morava com os pais, uma família de policiais militares. Eu trabalhei no caso com o repórter Leandro Becker, uma jovem esperto e bom de apuração. Claro que o principal suspeito era o namorado. Conseguimos entrevistá-lo. Foram duas semanas de trabalho pesado. No final da noite de 4 de outubro recebi uma ligação no hotel de um policial. Ele disse: “Achamos”.
Na manhã do desaparecimento, Luane embarcou em um ônibus com destino a Porto Alegre. Desceu na Vila Assis, em Fontoura Xavier, cidade agrícola às margens da BR-386, a 101 quilômetros de Passo Fundo, onde os passageiros fazem uma pausa na viagem. Ela fez um lanche, atravessou a rodovia e caminhou uns cinco quilômetros por uma estrada de chão. Entrou em um mato e se suicidou, conforme concluiu a investigação policial. Nos anos seguintes, estive várias vezes na casa da família conversando com o pai, um sargento aposentado da BM. Ela nunca acreditou na história do suicídio. Vejam bem. Nesse caso havia um suspeito e parecia que a coisa iria se resolver por ali. No final, a história correu em um outro rumo. Lição: esse tipo de episódio nunca se sabe como acaba. Alguns anos depois desse caso, um colega repórter que encontrei em uma cobertura em Mundo Novo (MS) me contou uma história interessante. Um jovem havia desaparecido de casa e, depois de duas semanas, todos acreditavam no pior. No final, o rapaz havia tido um colapso nervoso e foi encontrado vagando no meio de uma plantação de cana-de-açúcar.
Claro, trabalhei em outros casos: Sandra Mara Lovis Trentin, 49 anos, contadora desaparecida em Palmeira das Missões em 2018 (caso solucionado em 2019), Cláudia Hartleben, 47 anos, professora da Universidade Federal de Pelotas, sumida desde 2015 (sem solução), Bernardo Uglioni Boldrini, 11 anos, desaparecido na cidade de Três Passos em 2014 (caso resolvido), Cintia Luana Ribeiro, 14 anos, grávida de sete meses, desaparecida em Três Passos em 2011 (caso sem solução), e Sirlene de Freitas Moraes, 42 anos, que sumiu com o filho Gabriel, sete, em 2005, em Porto Alegre (também não resolvido). As vítimas desses três casos sem solução são procuradas vivas ou mortas pelos seus familiares. Uma coisa que aprendi lidando com esse tipo de caso. Na hora que são solucionados, o repórter dever ter todas as informações reunidas para não escrever bobagem. O primeiro momento é de emoção. Depois vem a hora de dar as explicações. Caso não haja uma solução, é obrigação do repórter ficar chutando a porta das autoridades para lembrá-los que há uma família vivendo desesperada por não saber o que aconteceu. Aqui é o seguinte. Um lembrete para os leitores. Por questões econômicas as grandes empresas de jornalismo abandonaram o interior do Brasil. Criando o que os cientistas da comunicação chamam de “deserto midiático” – em bom português: abandonaram os leitores à própria sorte. O que significa que agora quem tem que chutar as portas das autoridades são os jornais, rádios, TVs e sites do interior. É isso aí, colegas.