Como foram os bastidores das 24 horas que antecederam à votação, pelos três desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), da apelação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT – SP)? Essa é uma história a ser contada para os nossos leitores.
Até os inimigos mais ferrenhos de Lula acreditavam que a condenação seria por dois a um, o que deixaria uma boa chance dele concorrer nas próximas eleições presidenciais, para as quais lidera as pesquisas de opinião. A decisão unânime dos desembargadores João Pedro Gebran Neto, Leandro Paulsen e Victor Luis dos Santos Laus foi uma surpresa geral.
No ano passado, Lula tinha sido condenado na primeira instância a nove anos e seis meses pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro pelo juiz federal Sérgio Moro, da Operação Lava Jato. Os desembargadores ampliaram a pena para 12 anos e um mês e, com isso, não apenas praticamente inviabilizaram a candidatura do ex-presidente como ainda tornaram real a possibilidade da sua prisão. O que aconteceu?
Responder a essa pergunta aos nossos leitores não será fácil. Mas não é impossível. O primeiro passo é voltar à estaca zero. Logo depois da condenação de Moro, as atenções se voltaram para os três desembargadores do TRF4. Tanto repórteres quanto apoiadores de Lula e os seus adversários se debruçaram a esmiuçar o perfil de Paulsen, Santos e Laus, além de tentar saber tudo a respeito do presidente do TRF4, Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz.
No início de janeiro, começaram a circular nos noticiários e nas redes sociais informações de que um dos desembargadores iria votar favoravelmente a Lula. Faltando uma semana para o julgamento, eu liguei para cinco adversários do ex-presidente que fazem parte do governo do presidente Michel Temer (PMDB-SP). Eles não só defenderam a ideia do placar de dois a um como lembraram que o próprio Temer havia afirmado à imprensa que a condenação de Lula seria usada pelos seus apoiadores para torná-lo uma vítima. E que o bom seria ele concorrer e ser derrotado nas urnas.
Na época, vasculhei os noticiários e as redes sociais em busca de qualquer declaração feita pelos três desembargadores. Não encontrei nada. Conversei com vários colegas repórteres sobre o assunto e ninguém havia conseguido descobrir grande coisa sobre o que iria acontecer no julgamento.
Aqui uma coisa interessante. As especulações sobre como iriam votar os desembargadores ao poucos foram substituídas por notícias que davam conta de que eles teriam sido ameaçados. E logo depois veio uma enxurrada de matérias sobre as medidas de segurança para a realização do julgamento.
Na cabeça dos apoiadores de Lula, dos seus adversários e da maioria dos jornalistas, o escore de dois a um era dado como certo. Isso salta aos olhos nas matérias que publicamos. Logo depois de confirmado a votação de três a zero, a primeira coisa que pensei: não combinamos com os russos, um jargão que entre os repórteres significa que se deve lembrar de consultar todos os envolvidos antes de se dar um fato como certo. No caso, o lado principal não só ficou em silêncio como tomou o cuidado de não deixar vazar nenhuma informação.
Nos minutos seguintes ao voto unânime, começaram a brotar teses sobre o que havia acontecido. A que eu mais gosto é de teria havido um pacto entre os desembargadores. Os defensores dessa tese têm uma dezena de argumentos para sustentá-la. Mas é como a história do placar da votação de dois a um. Tudo não passa de “eu acho” e não ”tenho certeza”.
E é aqui que nós entramos. Aqui é que entra o trabalho do repórter. O que aconteceu antes, durante e depois da votação do TRF4 são informações que precisam ser apuradas em nome da exatidão jornalística. Saber como tudo aconteceu é uma exigência do nosso leitor. E dos estudiosos da história política do Brasil que são as pessoas que escrevem os livros didáticos que usados pelos nossos filhos nas escolas. Nós, repórteres, temos um belo desafio pela frente.