Todos já sabem o roteiro do filme. Os mísseis americanos que mataram o general iraniano Qassim Suleimani, na madrugada de sexta-feira (03/01), fará subir o preço do barril de petróleo (alta que se aproximava dos 4% na tarde de sexta). Até onde chegará, nós saberemos nas próximas semanas, a depender do desenvolvimento dessa nova crise no Oriente Médio. Mas o que vai acontecer no Brasil nesse cenário de petróleo mais caro?
A resposta para essa pergunta remonta a 2017, quando o então presidente da Petrobras, Pedro Parente, implantou uma nova política de ajuste dos combustíveis baseada nas oscilações do mercado internacional de petróleo. Até então, a Petrobras mantinha estáveis seus preços do óleo diesel e do gás de cozinha, sem repassar de imediato a volatilidade do mercado para o consumidor, mas arcando com eventuais prejuízos por conta do aumento do preço do barril e também do dólar. Na prática, vigorava uma espécie de subsídio por parte da estatal.
No início da nova política, os preços eram reajustados mensalmente, depois diariamente. A consequência foi uma greve de caminhoneiros, em maio de 2018, que durou 10 dias e causou um prejuízo para o país de R$ 15 bilhões, arruinando a economia que começava a reagir no governo do ex-presidente Michel Temer (MDB-SP). Durante a paralisação houve um forte trabalho do grupo político do atual presidente Jair Bolsonaro (sem partido) junto aos grevistas. A aliança de Bolsonaro com os caminhoneiros e os donos das empresas transportadoras se consolidou e hoje é um dos pilares da popularidade presidencial. Há uns dois meses essa aliança vem dando sinais claros de fadiga por conta do preço do diesel, que está em média mais caro do que na ocasião da greve – há farto material disponível na internet. Não tem como ser diferente, por dois motivos: o primeiro é que o atual ministro da Economia, Paulo Guedes, não só deu prosseguimento à política de Parente como a aprofundou. E, segundo, porque os brasileiros ganham em reais e os preços dos petróleo são reajustados em dólares americanos – hoje um dólar vale quatro reais.
Parte do que escrevi já tinha dito no post “Se os donos das transportadoras aderirem, a greve dos caminhoneiros sai e cresce”. Os caminhoneiros autônomos havia marcado uma paralisação para o dia 16 de dezembro. A greve não saiu. Mas o recado foi dado para Bolsonaro, me falou um empresário do setor. Eu quero alertar o leitor e os meus colegas, principalmente os jovens, que nós escrevemos “empresários” nos referindo aos donos das 1.286 transportadoras existentes no país. Mas, na verdade, mais de 60% deles têm apenas cinco ou seis caminhões. Portanto, trabalham com a corda esticada. Tenho conversado com eles. A maioria conserva a sua fé e lealdade nas bandeiras defendidas por Bolsonaro. Tanto que acreditam que a privatização da Petrobras é a solução para baixar os preços dos combustíveis. Hoje (03/01) liguei para um deles no interior do Paraná. Ele tem seis caminhões rodando, e dirige um deles. Perguntei o que aconteceria em uma eventual aceleração nos preços do diesel por conta “do rolo dos americanos com o general iraniano”. A resposta foi curta: “Vamos para o pau, não temos outra saída”.
Na greve de 2018, Parente preferiu se demitir a mexer na sua política de preços. Qual o caminho que irá tomar Paulo Guedes na questão dos preços do óleo diesel? Tudo o que ele falou até aqui, como privatizações do setor, são medidas que trarão resultados a médio e longo prazo. Mas o problema é hoje. E mesmo que a morte do general iraniano não acelere o preço do petróleo, o fato é que ele está muito caro para os caminhoneiros, principalmente os autônomos, que somam 374 mil no Brasil.
Se essa questão for resolvida de maneira técnica, seguindo os ensinamentos liberais, o governo não mexe na política de preços. Se Bolsonaro resolvê-la politicamente, ele perde o seu ministro da Economia, baixa o preço das ações da Petrobras e terá que dar um monte de explicações para os investidores internacionais. Mas fica bem com os caminhoneiros e sua popularidade cresce. Como diz o dito popular: “Não se pode acender uma vela para deus e outra para o diabo”. Nós jornalistas precisamos ficar atentos ao destino da aliança entre Bolsonaro e os caminhoneiros para não escrever bobagens para nosso leitor. É simples assim.