Trocando em miúdos a história dos desaforos disparados pelo bilionário nascido na África do Sul e naturalizado americano Elon Musk, 52 anos, contra o ministro Alexandre de Moraes, 55 anos, do Supremo Tribunal Federal (STF). A cúpula do movimento bolsonarista organizou os acampamentos ao redor das unidades das Forças Armadas para pressionar os militares a dar um golpe de estado. Falharam porque os militares legalistas não aderiram ao golpe. O símbolo dessa situação é o 8 de janeiro de 2023, quando bolsonaristas deixaram um rastro de destruição nos prédios do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF), na Praça dos Três Poderes, em Brasília. Na ocasião, mais de 1,5 mil pessoas foram presas. Várias já foram sentenciadas e outras aguardam julgamento. O ex-presidente Jair Bolsonaro foi declarado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por oito anos. O movimento seguinte aconteceu quando a cúpula do bolsonarismo recorreu à extrema direita dos Estados Unidos, pedindo socorro para tentar reverter a inexigibilidade do ex-presidente e pressionar o Congresso e os ministros do STF pela anistia aos presos que estão sendo processados pelo 8 de janeiro. Foi dentro desse contexto que apareceu Musk, disparando desaforos contra o ministro Moraes e ameaçando não cumprir sentenças do STF que determinaram o cancelamento de perfis de golpistas no antigo Twitter, atual X.
Musk elegeu como alvo o ministro Moraes porque ele é responsável pelos processos contra os envolvidos na tentativa de golpe de 8 de janeiro. E puxou para a bronca o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para aumentar a repercussão dos desaforos. O empresário está fazendo o serviço sujo para a extrema direita americana. Foi rotulado pela imprensa brasileira de extrema direita. É muito mais que isso. Ele não tem fidelidade a ideais, seja lá qual for a sua doutrina política. O negócio dele é aproveitar as oportunidades para ganhar dinheiro. Foi assim que conseguiu vultosos empréstimos do governo americano, durante a presidência do democrata Barack Obama (2009 a 2017) – há matérias na internet. Na questão do Brasil, viu uma oportunidade de apostar nos bolsonaristas que tentaram dar o golpe por acreditar que, caso conseguisse gestar um ambiente que desestabilizasse o atual governo, o que beneficiaria os golpistas, seria visto como a pessoa que abriu o caminho para a volta do bolsonarismo ao poder. Ele está fazendo isso por simpatia aos seguidores do ex-presidente? Não. Vê nisso uma oportunidade de grandes negócios, como ter acesso privilegiado às reservas minerais do Brasil. O que acontecerá com Musk caso os golpistas não tenham sucesso. Nada. Porque, apesar dos desaforos proferidos contra Moraes, ele não cruzou a linha vermelha, como, por exemplo, mandar desbloquear os perfis dos golpistas. De bônus ainda leva a tremenda publicidade que conseguiu com esse episódio. Tem mais o seguinte. O Brasil é um país continental, industrializado, que se perfila entre as 10 maiores economias do mundo e tem uma população de mais de 200 milhões de habitantes. E o mais importante de tudo: é uma democracia jovem mas musculosa, que já se mostrou capaz de resistir a ataques.
O ataque de Musk ressuscitou a necessidade da regulamentação das redes sociais no Brasil. O projeto já foi aprovado no Senado e repousa há três anos nas gavetas da Câmara dos Deputados. O seu relator é o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP). Nos primeiros dias após os desaforos do empresário contra Moraes, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), apressou-se em anular o projeto em tramitação e nomear uma comissão para começar tudo da estaca zero. Lira fez uma manobra para evitar se posicionar contra a atitude de Musk e, com isso, não se envolver em confrontos com os parlamentares bolsonaristas que somam a maioria na Câmara. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PDS-MG), posicionou-se a favor da aprovação da legislação e contra os desaforos disparados por Musk. O presidente do STF, o ministro Luís Roberto Barroso, lembrou que qualquer empresa que opera no país está sujeita à legislação brasileira. O presidente Lula evitou mencionar o nome do empresário. Mas foi enfático em associar as falas de Musk aos objetivos da extrema direita. Na imprensa e nas redes sociais começa a tomar corpo uma conversa de que o empresário está afrontando os brasileiros. Se essa conversa prosperar poderá encurralar os seus defensores. Como? Apoiar os desaforos de Musk seria ir contra o Brasil. A cúpula do bolsonarismo está atenta a esse assunto. Aqui uma explicação. Tenho falado sobre a cúpula sem dar maiores explicações. Nos dias atuais, o seu núcleo duro é integrado pelo general da reserva Braga Netto, que foi candidato a vice na chapa de Bolsonaro que tentou a reeleição, Flávio Bolsonaro, senador pelo Rio de Janeiro e um dos filhos do ex-presidente, os pastores neopentecostais Silas Malafaia (Assembleia de Deus Vitória em Cristo) e Edir Macedo (Igreja Universal do Reino de Deus e Grupo Record, um conglomerado de TVs, rádios e jornais) e Valdemar da Costa Neto, presidente do PL, o partido de Bolsonaro.
Os pastores Malafaia e Macedo não fazia parte da cúpula do bolsonarismo durante o mandato do ex-presidente. Agora fazem e têm a seu dispor centenas de pastores que pregam em seus cultos o discurso do ódio misturado a passagens da Bíblia, tendo como alvo os ministros do STF, em especial um deles, Alexandre de Moraes. Musk é um personagem que contribui para fixar na opinião pública a versão desse grupo sobre os ministros. Enquanto for capa dos jornais, Musk serve a causa dos bolsonaristas. Assim que descer para o pé da página vai ser substituído por outra personagem. É assim que funciona. O importante é manter a bolha da versão funcionando.