O próximo dia 7 de setembro marcará muito mais do que o 195º aniversário da Independência do Brasil. Entrará na história do país como o dia em que o cinema nacional entrou na guerra contra a cultura da corrupção, enraizada na maneira de fazer negócios e política no Brasil, com o lançamento do filme “Polícia Federal – A Lei é Para Todos”. O filme conta os bastidores do nascimento, do crescimento e da maturidade da Operação Lava Jato, que é considerada a maior investida policial do mundo contra a corrupção.
O juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba (PR), inspirou-se nos erros e nos acertos da Operação Mãos Limpas (1992 a 1996), na Itália, para articular a Lava Jato. E os cineastas brasileiros seguiram o exemplo de seus colegas norte-americanos de Hollywood que aprenderam a usar os filmes como armas durante a Segunda Guerra Mundial (1939 a 1945). Na época, os Aliados (Estados Unidos, Inglaterra e vários países, incluindo o Brasil) lutavam contra o Eixo (Alemanha, Itália e Japão). Antes de ser disparado o primeiro tiro da guerra, Joseph Goebbels, ministro da propaganda da Alemanha nazista, montou uma bem lubrificada máquina de publicidade do regime, usando filmes.
A máquina de propaganda de Goebbels conseguiu infiltrar as ideias nazistas nos Estados Unidos e em outros países da região, como Brasil e Argentina – há dezenas de documentários na internet sobre o assunto. A indústria cinematográfica de Hollywood foi convocada para a guerra e lançou dezenas de filmes. Um deles se tornou um clássico: “O Grande Ditador”, de Charles Chaplin (1940). O famoso cineasta Walt Disney (falecido em 1966), criador do Pato Donald, viajou pelas Américas para enfrentar a influência da máquina de propaganda nazista. No Brasil, ele lançou Zé Carioca, um papagaio que mostra a maneira brasileira de ver o mundo. Na Guerra Fria (1945 a 1991), travada entre os Estados Unidos e seus aliados contra a extinta União Soviética, Hollywood teve um peso enorme na derrota dos soviéticos. A derrota dos Estados Unidos na Guerra do Vietnã (1955 a 1975) é mostrada nos filmes “Platoon” (1986) e “Nascido em 4 de Julho” (1989). Os filmes ajudaram a consolidar a ideia na população do alto preço que é pago quando o país se envolve em guerras alheias.
A história mostra o poder dos filmes como propagandistas de uma ideia. No Brasil, em 2008, quando as tropas combinadas ocuparam as favelas cariocas, um ano antes, o filme “Tropa de Elite” mostrou a letalidade do Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE) no enfrentamento com as quadrilhas de traficantes no Rio de Janeiro. Não era por nada que os Caveiras – como são conhecidos os policiais militares do BOPE – estavam à frente das tropas combinadas que ocuparam as favelas. Em 2010, o filme “Tropa de Elite2: O Inimigo Agora é Outro” mostrou o uso da letalidade do BOPE por políticos cariocas corruptos. Meia dúzia de anos depois, as investigações da força-tarefa da Operação Lava Jato mostraram que, de ficção, não tinha nada no filme. O ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (2007 a 2014), investigado pela Lava Jato, cumpre uma pena de 14 anos por corrupção.
Como repórteres, é dentro desse contexto que descrevi que temos que explicar ao nosso leitor o filme “Polícia Federal – A Lei É para Todos”. A nossa visão tem que estar além do enredo do roteiro. Como se fosse um produto na prateleira do comércio varejista, o filme vende a ideia para o público que a maneira de fazer negócios e política tem que mudar porque, finalmente, a lei chegou a porta dos poderosos. Temos que mostrar ao nosso leitor que os agentes da lei – juízes, promotores, delegados e policiais – não são super-heróis. São funcionários públicos, fazendo o seu trabalho, respaldados por um estado de direito que foi conseguido a um custo altíssimo – muita gente morreu, foi torturada e perdeu emprego na luta contra o Regime Militar (1964 a 1985) – para a implantação da democracia no Brasil. E os corruptos e corruptores – empresários, parlamentares, doleiros e marqueteiros políticos – não vão ser extintos com a Operação Lava Jato. Eles continuarão povoando a conjuntura política nacional, como fazem em todas os países do mundo. A diferença é que, agora, sabem que, se forem descobertos, eles serão presos. Essa é a ideia que o filme vende.
O filme deverá influenciar o eleitor em 2018. E cabe a nós, repórteres, dar as informações corretas, de maneira simples, para o nosso leitor entender o que não está explicito no roteiro do filme. Mas está lá.