Nos anos 60, os grupos políticos usavam as Forças Armadas para tomar o poder na América do Sul. Hoje, usam as informações privilegiadas para se instalarem nos governos. O exemplo mais acabado dessa realidade é o grupo político de Sergio Moro, ministro da Justiça e Segurança Pública. Para entender essa história, temos que fazer uma leitura atenta do que vem sendo publicado a conta-gotas desde o meio do mês de junho pelo o site The Intercept Brasil. São denúncias do comportamento ilegal do então juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal, de Curitiba (PR), com os procuradores da República da força-tarefa da Operação Lava Jato, em especial com o coordenador, Deltan Dallagnol. O site vem publicando mensagens escritas no aplicativo Telegram que lhe foram entregues por uma fonte anônima. O site preserva o direito de não revelar detalhes sobre a fonte. Mas as informações têm o selo de garantia do jornalista americano Glenn Greenwald, dono de um extenso e bem sucedido currículo – disponível na internet.
O grupo político de Moro nasce no seio da força-tarefa, que é formada por procuradores, agentes da Polícia Federal (PF) e da Receita Federal. A operação nasceu em 2009 e em que momento alguns de seus integrantes, como Dallagnol, deixaram de lado a função de operadores da Justiça para se tornarem políticos é difícil de definir. Mas o marco foi a condenação do ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT – SP) pelo então juiz Moro a 9 anos e meio de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro – o caso do apartamento triplex em Guarujá (SP). A sentença foi confirmada e ampliada para 12 anos pelos desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TFR4), em Porto Alegre (RS). A condenação em segundo grau levou Lula para a cadeia, ele cumpre pena em uma sala da PF transformada em cela, em Curitiba. E também impediu que concorresse a presidente da República, em que era líder nas pesquisas de intenção de voto. O seu adversário era o atual presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL – RJ). Mensagens trocadas pelos procuradores e publicadas pelo Intercept mostram o receio que tinham que a lisura do julgamento de Lula fosse questionada pela ida de Moro para o governo do maior adversário do ex-presidente.
Moro não foi sozinho para o governo. Assim como Bolsonaro ocupou vários cargos com militares da reserva, Moro usou agentes da PF e da Receita Federal para ocupar postos estratégicos dentro do seu ministério. Um deles foi Roberto Leonel. Ele foi chefe do serviço de inteligência da Receita até 2018. Ele assumiu o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). E textos publicados no ultimo fim de semana (18.08.19) pelo site e pela Folha de S.Paulo mostram que, quando era da Receita, Leonel forneceu a Dallagnol, de maneira ilegal, informações sobre pessoas, algumas delas sendo investigadas pela Lava Jato. Aqui chegamos a um ponto importante dessa história. Logo que começaram as denúncias contra Moro, Bolsonaro posicionou-se em defesa de seu ministro. Desqualificando as denúncias do site e fazendo acusações contra o jornalista americano. Mas intensificou a neutralização dos indicados por Moro que faziam parte do governo – há um material vasto na internet. Por que o presidente fez isso? Simples. O grupo político de Moro tem gente colocada em pontos estratégicos da máquina da Justiça e do governo federal. Pessoas com acesso a informações privilegiadas, como foi denunciado pelo site. Essas informações foram importantes na condenação de Lula. Bolsonaro é capitão da reserva do Exército e sabe que, nos dias atuais, uma informação vale mais do uma arma carregada e engatilhada na mão. Ele tem problemas com seu filho, o senador Flávio (PSL – RJ), que está sendo investigado por ter pego parte dos salários dos funcionários do seu gabinete, quando era deputado estadual no Rio – a história está disponível na internet. Moro foi levado para governo como símbolo do comprometimento da luta contra a corrupção. O símbolo está sendo comprometido pelas denúncias do site. Bolsonaro está aproveitando a situação para livrar-se de uma situação incomoda e de enorme potencial de perigo para a sua sobrevivência política. É simples assim.