A eliminação da seleção de futebol da Alemanha na Copa do Mundo, tarde de quinta-feira (01/12), me trouxe uma lembrança que tem a ver com a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Lembrei-me que nos meses que antecederam a realização da Copa do Mundo no Brasil, em 2014, havia o temor das autoridades da segurança pública que grupos como os Black Blocs, que haviam atuado de maneira violenta na onda de protestos públicos de 2013, colocassem em risco a realização do evento. Com uso de tecnologia de ponta foi montado um sistema de segurança que não só garantiu a realização da Copa como também dos Jogos Olímpicos de 2016, no Rio. Nos dois eventos transitaram pelo Brasil atletas, autoridades e pessoas de vários cantos do mundo. Fiz esse nariz de cera para lembrar que as autoridades brasileiras têm tecnologia de segurança desenvolvida e testada em grandes eventos que garantirão sem maiores problemas a posse do presidente da República. É sobre isso que vamos conversar.
A posse de Lula vai acabar com o vazio do poder que alimenta os movimentos que contestam o resultado das eleições. Vamos aos fatos. A sensação de vazio de poder provocada pelo sumiço do presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), nos dias seguintes à derrota nas eleições foi fundamental para a consolidação da luta pelo golpe de estado por parte dos seus seguidores acampados na frente de quartéis e em bloqueios de estradas. O presidente não sumiu por qualquer outro motivo que não tenha sido o de fortalecer os golpistas. A história ensina a nós repórteres que nada fortalece mais os conspiradores do que a ausência da autoridade. Ainda mais quando é o presidente da República que some. Um alerta aos leitores e colegas repórteres. O que estou escrevendo não é opinião. Mas fatos que temos publicado nos últimos meses em nossas matérias. A história de inundar o ambiente com discursos do ódio e influenciar a violência. E essa inundação do ambiente vem se avolumando nos últimos tempos graças ao surgimento de novas tecnologias de comunicação, como os celulares e diversos aplicativos. Já vi isso acontecer. E a primeira vez foi em março de 1987. Dois anos antes, em 1985, 1,5 mil famílias do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) haviam invadido uma propriedade chamada Fazenda Annoni, localizada à beira da estrada que liga Passo Fundo a Ronda Alta, no interior do Rio Grande do Sul. Nas proximidades da ocupação fica Carazinho, uma cidade agroindustrial. Ali surgiu o Pacto da União Ruralista (PUR), uma organização de proprietários rurais que prometiam reagir com armas às invasões do MST na região. Foi no lançamento do PUR que conheci o então deputado estadual gaúcho Augusto Nardes (PP), que hoje é ministro do Tribunal de Contas da União (TCU). Nardes recentemente tornou-se notícia nacional por conta do vazamento para a imprensa de áudios conspirando contra o estado de direito – há matéria na internet.
Na ocasião, os fazendeiros ligados ao PUR inundaram as rádios da região com notícias descrevendo os sem-terra como terroristas, estupradores, assassinos e outros adjetivos. Ninguém me contou essa história. Eu estava lá e fiz matéria. Voltando a 1987. Os acampados na Annoni estavam fazendo uma manifestação na BR-386, em um dos trevos de acesso à cidade de Sarandi, a 40 quilômetros ao norte de Carazinho. Foi quando o motorista de um caminhão de entregas de uma cidade da região avançou sobre o bloqueio, atropelando os acampados e matando Lari Grosseli, 23 anos, Vitlino Antonio Mori, 32, e Roseli Nunes da Silva, 33. Lembrei-me dessa história em maio de 2019, meses depois que Bolsonaro assumiu o mandato e começou a inundar os noticiários com fake news, no post O legado para o jornalismo da morte da sem-terra Rose. Na ocasião, eu li o inquérito policial que apurou o caso. Lá estava descrita a influência que teve no caso os desaforos disparados pelos fazendeiros contra os sem-terra nas emissoras de rádio da região. Lembro que, em 1987, não existia celular nem internet, portanto as comunicações eram mais lentas e as notícias demoravam muito para chegar ao leitor. Como disse, hoje a situação mudou com as novas tecnologias. Na quinta-feira (24/11) da semana passada, 35 anos e alguns meses depois do episódio no trevo de Sarandi, o primeiro-sargento da Marinha Ronaldo Ribeiro Travesso, lotado no Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, colocou nas redes sociais um vídeo prometendo que Lula não subiria as escadas do Planalto, além de proferir um monte de outras besteiras – há matéria na internet. Esse vídeo circulou nas redes com uma velocidade fantástica. Sempre digo que quando publicamos alguma coisa é como se tivéssemos disparado uma bala de um revólver. Depois de disparada, ela não volta para o cano. Colegas, pensem o seguinte. Nos últimos quatro anos, quase diariamente, a máquina de fake news montada pelo governo Bolsonaro tem inundado o país com um discurso do ódio. Nesse discurso, Lula é o símbolo de tudo que existe de errado no mundo.
A facilidade como o discurso ódio circula no país deve-se ao fato que a exemplo do que aconteceu nos Estados Unidos, no Brasil surgiram emissoras de rádio, jornais, sites e redes de TV, como a JP News, que se alinharam na defesa das teses de conspiração pregadas por personagens como Bolsonaro e o ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump (republicano). A entrada dessas empresas de comunicação significa que a conspiração virou um negócio. Há estudos de respeitáveis universidades ao redor do mundo que analisam essa situação. Ainda é cedo para dizer no que isso tudo dará. Para arrematar a nossa conversa. Graças aos sistemas de segurança que garantiram a Copa de 2014 a única lembrança que os brasileiros têm daquele Mundial foi a goleada de 7 a 1 aplicada pela seleção da Alemanha sobre o Brasil. A partida final da Copa de 2022, que acontece no Catar, Oriente Médio, será no dia 18 de dezembro. Lula toma posse no Ano Novo, duas semanas depois da final da Copa. Com a Alemanha fora do caminho, as chances da Seleção Brasileira ganhar o caneco aumentaram.