A continuar a aproximação do PSDB com o grupo político do presidente da República Jair Bolsonaro (PSL – RJ), uma conversa franca e direta com o prefeito de Porto Alegre, Nelson Marchezan Júnior, pode ser interessante aos novos administradores do Brasil. Eleito prefeito em 2016, Marchezan foi considerado um rebelde dentro do PSDB, quando foi deputado estadual e depois federal, ao se notabilizar por reclamar contra os altos salários pagos aos servidores da Justiça, em particular aos juízes. As raízes políticas do prefeito e do presidente eleito se cruzaram no passado. O pai do prefeito, Nelson Marchezan (falecido em 2002), foi deputado federal pela extinta Arena, partido que dava suporte ao governo militar (1964 a 1985). Por ser um exímio negociador, ele era respeitado pela oposição. Bolsonaro é capitão da reserva do Exército e defende o legado dos militares que deram o golpe em 1964. Mas o interessante da conversa entre o prefeito Marchezan, 47 anos, e Bolsonaro, 63 anos, não vai ser o passado. Mas o futuro.
É importante prestar atenção em um traço comum à personalidade dos dois: eles são arrogantes e acreditam que descobriram a roda. Eles se elegeram com propostas políticas muito semelhantes, por exemplo: colocar técnicos como secretários, não usar cargos para barganha política, vender patrimônio público, racionalizar os gastos, retirar benefícios dos funcionários públicos e por aí afora. Aqui entra o motivo da conversa entre os dois. O prefeito Marchezan começou a administrar Porto Alegre no início de 2017, portanto já tem dois anos de trabalho. Bolsonaro vai começar a administrar na virada do ano. Daí que uma conversa com o prefeito sobre o deu certo e o que deu errado na administração da Capital gaúcha pode ajudar. O que deu errado até agora na Prefeitura de Porto Alegre: os secretários técnicos acumularam um fracasso atrás do outro, pediram as contas e foram embora. O prefeito não conseguiu aprovar projeto importante algum na Câmara de Vereadores. Porto Alegre é hoje uma cidade abandonada, onde a prefeitura sequer consegue tapar os buracos nas ruas e nas avenidas. Aqui entra o trabalho do repórter. Por que Marchezan fracassou?
Tem uma penca de motivos. Mas dois deles saltam aos olhos. Descontando a crise econômica, o primeiro motivo que levou a administração do prefeito ao fracasso foi o desrespeito dele com os funcionários que fazem parte da máquina administrativa da Prefeitura. Acreditou que se assessorando de administradores formados em universidades famosas, com curso de pós-doutorado, iria ensinar os “macacos velhos” – jargão usado pelos repórteres para descrever pessoa experiente – a trabalhar. Pelo menos 90% dos 1,5 mil servidores municipais são pessoas altamente qualificadas e que se dedicam a sua profissão. Lembro que um dia liguei para um conhecido em um das secretarias e reclamei de um buraco na avenida onde moro. Ele respondeu: “E vão ter outros buracos, porque o homem (secretário) não entende nada do assunto”. A resposta dele acendeu o sinal vermelho na minha curiosidade e dei umas ligadas para outros setores da prefeitura. A minha conclusão foi que a máquina administrativa simplesmente cruzou os braços e deixou o prefeito e os seus doutores abandonados à própria sorte. O segundo motivo do fracasso de Marchezan foi ter menosprezado a negociação política com os vereadores. Acreditou que iria enfiar garganta abaixo dos parlamentares os seus projetos. Claro, não enfiou. Um comentário pessoal meu. Aqui no Rio Grande do Sul costuma-se se dizer que a fruta não cai longe do pé, como uma maneira de dizer que o filho herdou uma habilidade do pai/da mãe. O pai do prefeito foi um político muito habilidoso em uma época complicada. Eu o entrevistei várias vezes. O desempenho do prefeito mostra que esse dito popular não se aplica a ele.
Entre os secretários, o prefeito Marchezan é conhecido como a pessoa que “tem chiliques” nas reuniões, sempre que as coisas não saem como foram planejadas. A exemplo do prefeito, Bolsonaro tem atirado muita pedra contra os funcionários públicos federais. Não tem tido o devido respeito de separar o joio do trigo, especialmente o seu superministro, o economista Paulo Guedes. Qual é a reação que os funcionários públicos federais que cumprem os seus deveres profissionais vão ter com o modo de administrar do grupo político de Bolsonaro? Vamos saber no primeiro ano de mandato do novo presidente. Marchezan fracassou até agora porque não combinou com os russos – conta a lenda que foi Garricha que disse a frase durante a prelação do técnico Vicente Feola na Copa 68 contra a extinta União Soviética. E Bolsonaro, ele combinou com os russos?