Em qual boteco desse imenso país há um cara contando como fez o gol no Barcelona que tornou o Internacional Campeão do Mundo de 2006? Ele é Adriano Gabiru, 40 anos, um alagoano que, aos 36 minutos do segundo tempo, fez o gol até agora mais importante da história do Colorado. Em 2008, foi desligado do Inter e, desde então, entrou em um processo de decadência acelerado. Ao deixar Gabiru à própria sorte, o Inter humilhou o seu herói. Lembro que, na ocasião, houve um debate forte entre os colorados sobre o destino de Gabiru, muitos, como eu, defendiam que o Inter deveria continuar pagando o salário dele para que andasse pelo país, contando para as novas gerações de colorados o que foi aquele jogo.
Nos últimos 40 anos, tenho sido repórter investigativo e não tenho conhecimento técnico para me meter a escrever sobre estratégia de futebol e outros assuntos que considero chatos. Mas sou um contador de história. E toda vez que o meu time é humilhado, como foi o caso do Gre-Nal do último sábado, eu lembro da história do nosso herói, o Gabiru. Por essas coisas do destino, nós fomos humilhados por um herói gremista, Renato Portaluppi. Ex-jogador do Grêmio e atual técnico do time, que, por seus atributos pessoais, tem uma carreira de sucesso.
Nos momentos ruins de Renato, ele sempre teve Fábio Koff, um grande dirigente gremista falecido durante a semana passada, como conselheiro. Não há registro de algum dirigente do Inter ter estendido a mão para o Gabiru, um cara humilde que, pela sua formação, precisava da orientação de uma pessoa esclarecida. Aqui gostaria de refletir com os meus colegas repórteres velhos e com os novatos. Deixando de lado análise técnicas e outras babaquices que escrevem sobre os jogos, eu digo que o respeito aos heróis do clube é fundamental para seguir em frente. Lembram de 2010? Na disputa do Campeonato Mundial de Clubes, o Inter perdeu para o Mazembe, um discreto time da República Democrática do Congo, por dois a zero. Aquele jogo foi, é e vai continuar sendo uma das maiores humilhações sofridas pelo Inter.
Na época, eu imaginei o que se passou na cabeça do Gabiru, naquele dia da derrota para o Mazembe. Em 2010, ele já era um farrapo humano, contando a história do seu gol pelos rincões do Brasil. Na semana que antecedeu o Gre-Nal do último sábado, o conteúdo das reportagens e dos comentários era que o Inter levaria uma enxurrada de gols. O Grêmio era descrito como o melhor time da América do Sul em atividade. Durante o jogo, eu estava rodando pela BR-290, vindo de Encruzilhada do Sul para Porto Alegre. Tinha ido visitar a minha mãe, a dona Lony, uma senhora de 85 anos que tem mania dar conselhos. Ela disse para que eu não escutasse o jogo para evitar de ficar brabo e acabar me acidentando Eu não tinha a intenção de escutar mesmo. Mas não resisti à curiosidade, uma vez, ou outra, desobedecia dona Lony e dava uma escutada para saber quantos gols o Grêmio já tinha feito. Logo que Porto Alegre surgiu no horizonte, o jogo terminou. Liguei o rádio para ouvir os comentários. Escutei o Renato chamar o Inter de “time pequeno”. Pensei: faz parte do jogo. Mas aí comecei a escutar os comentaristas. Eles não falaram a palavra Mazembe. Porém, descreveram o Grêmio como um grande time que havia sido humilhado por um timeco, no caso o Inter. Pensei: tivemos o nosso dia de Mazembe. Sempre fiz reportagens de conflitos. E aprendi que feitos passados não são garantias de vitórias no presente. Mas o respeito a eles é um incentivo importante na luta pela vitória. O resgate do feito do Gabiru, um jogador desacreditado na época, é importante para seguir em frente.