Ao redor do mundo, o homem latino-americano tem fama de ser um machista. Essa fama foi reforçada pelo vídeo feito por aquele grupo de torcedores brasileiros durante a Copa do Mundo com uma jovem russa: aproveitando-se que ela não entende português, induziram a garota a repetir palavras referentes ao órgão sexual feminino – há dezenas de matérias na internet sobre o assunto. A reação dos colegas repórteres que estão trabalhando na cobertura da Copa foi à altura. Correram atrás da notícia, conseguiram identificar três deles e não estão deixando o assunto ser esquecido.
O crime cometido por esse grupo é bem mais amplo. Eles não só conseguiram ofender a todas as mulheres do mundo como também cuspiram no legado deixado pelos grandes craques com a camisa da Seleção Brasileira. Ela é idolatrada em todos os rincões do mundo, graças ao legado deixado pelo Pelé, Tostão, Garrincha, Didi (o criador da “Folha Seca”) e tantos outros ídolos. Mesmo nos rincões onde existem conflitos, o legado dos grandes craques é lembrado. Fui testemunha disso. Eu sou um velho repórter, 68 anos, 40 deles andando pela América do Sul e pela África fazendo reportagens em conflitos. No começo dos anos 90, eu estive na Guerra Civil de Angola, na África, trabalhei com as tropas do governo, ao redor de Luanda, capital do país, e com os guerrilheiros, na cidade de Huambo. Nos dois locais, eu fui chamado para um canto para falar sobre futebol. Em 2008, eu estive em um conflito entre campesinos paraguaios (sem terra) e brasiguaios (agricultores brasileiros que migraram para o Paraguai), na província de San Pedro, onde havia sido queimada uma bandeira brasileira. Entre uma confusão e outra, eu fui chamado pelos paraguaios para conversar sobre Pelé. Qualquer repórter que andou trabalhando pelo mundo sabe que vai acabar sendo chamado para conversar sobre futebol.
Ainda é desconhecida a atitude que o governo da Rússia vai tomar no caso. Lembro que, em 2013, na Bolívia, 12 torcedores do Corinthians ficaram presos durante cinco meses, suspeitos de ter matado um torcedor, Kevin Espada, 14 anos, ao disparar um sinalizador. O caso foi na partida pela Libertadores entre Corinthians e San José. Outro caso. Durante as Olimpíadas no Brasil (2016), nadadores americanos armaram uma confusão em posto de combustíveis e encobriram o fato, mentindo que haviam sido assaltados. A mentira foi descoberta, e eles acabaram tendo problemas com as autoridades brasileiras e perderam seus patrocinadores nos Estados Unidos. Seja lá qual for a atitude do governo da Rússia com o caso do vídeo, o certo é que esses torcedores não podem ficar apenas restritos à condenação moral e à investigação interna feita pelas corporações a que eles pertencem. Na verdade, eles cometeram dois crimes: um contra as mulheres e outro contra o legado deixado pelos grandes craques com a camisa da Seleção Brasileira. Portanto, o Ministério Público Federal (MPF) tem que intimá-los para esclarecer os fatos. Os crimes que eles cometeram são muito sérios.