Os agentes da Polícia Federal que integram a força-tarefa da Lava Jato tinham conhecimento da interferência do então juiz Sergio Moro no trabalho dos procuradores da República, que vem sendo denunciada com a publicação dos diálogos entre eles no aplicativo Telegram pelo site The Intercept Brasil? Se sabiam, eles fizeram algum relatório a respeito? Ou não viram que um crime estava sendo cometido bem debaixo dos seus narizes? As duas perguntas são a síntese de uma longa conversa que tive na semana passada, em Porto Alegre (RS), com um agente aposentado da Inteligência da PF do Paraná. Ele hoje trabalha com consultoria de risco nas áreas de fronteira.
Antes de seguir contando a história. Eu fui apresentado para o então agente em 2001 por um de seus colegas da “comunidade de informações” que trabalhava no Rio Grande do Sul. Na ocasião, eu fazia reportagens sobre as operações que os serviços de inteligência, especialmente os americanos, faziam na fronteira do Brasil com o Paraguai à procura de pessoas que tivessem ligações com os terroristas que jogaram os aviões contra as Torres Gêmeas em Nova Iorque. Ficamos “conhecidos” – não existem amigos na área de inteligência policial. Ele me ajudou muito na investigação que fiz em 2003, quando escrevi o livro País Bandido. Voltando a conter a história. Lembro que, no ano passado, houve na força-tarefa da Lava Jato um “desconforto” entre os procuradores da República e os agentes da PF sobre quem investigava. Na ocasião, eu cheguei a trocar idéias com colegas repórteres que o “desconforto” era uma oportunidade de conseguir fontes internas da operação. A ideia não prosperou.
Agora, a situação é outra. As publicações do site colocaram contra a parede Moro, que hoje é ministro da Justiça e Segurança Pública do presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL – RJ). Pelo que já foi publicado pelo The Intercept, o coordenador da Lava Jato, o procurador da República Deltan Dallagnol é uma espécie de “cabeça de lata” – uma expressão, usada pelos repórteres que fazem cobertura policial, que significa uma pessoa guiada por outra. Além dos agentes da PF, a força-tarefa também tem gente da Receita Federal. Portanto, temos uma boa oportunidade de bater na porta dessas pessoas para conversar sobre a relação do então juiz Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, com os procuradores. Já consegui fechar boas matérias sobre bastidores com informações de pessoas que orbitavam ao redor dos personagens principais do fato. Mais ainda: existe um conflito latente entre a PF e os procuradores da República sobre a questão da investigação. Os agentes da PF nunca gostaram, e não escondem o fato, de ver os procuradores envolvidos em trabalho de campo.
Na gíria das redações, as investigações, tipo as feitas pelo Lava Jato, são chamadas de “grosso calibre”, por lidar com pessoas importantes, portanto, advogados caros. Em um cenário desses, qualquer “barbeiragem” na condução da apuração pode virar munição nas mãos dos advogados. O fato do Moro ter guiado o trabalho dos procuradores é crime – há um vasto material publicado sobre o assunto na internet. O que significa que os policiais têm que agir. A nossa tarefa é descobrir para o nosso leitor se eles agiram. Ou não sabiam de nada. É simples assim.