A correria nas redações dos jornais nesses dias que antecedem as eleições começou e se acelerar a cada dia à medida que se aproxima o 2 de outubro, quando acontecerá a disputa do primeiro turno. Nessas alturas dos acontecimentos, as férias de repórteres já foram adiadas. Se ainda vivêssemos os tempos que havia fartura de dinheiro nas empresas de comunicação, jornalistas estariam sendo contratados para reforçar as equipes. Atualmente, estão remanejando o pessoal existente, aumentando o número de pautas por repórter. Os editores andam pelos cantos tendo conversas ao pé do ouvido com as suas equipes e no final do papo vem a recomendação: “não se afastem do celular”. É uma recomendação desnecessária. Porque faz parte da cultura do repórter viver grudado no seu telefone. Lembro que uma das nossas brincadeiras preferidas era dizer que um colega era irreconhecível sem o celular na orelha. As redações costumam ser exageradas. Lembro bem desses exageros e vou citar um que me custou uma noite de fim de ano. Na noite da virada de 1999 para 2000 eu fazia parte de uma equipe de reforço aos plantonistas na redação à espera do “bug do milênio”, como foi chamado o temor de que os computadores da época não entendessem a mudança da data e causassem uma pane geral nos sistemas que apagaria todos os arquivos – há um vasto material disponível na internet sobre o assunto. Não deu em nada.
Mas dessa vez não há exagero das redações. Porque é do conhecimento de todos que existe uma longa lista de fatos que podem acontecer e que têm a capacidade de tumultuar as eleições, em especial para presidente da República, cujos principais candidatos são Jair Bolsonaro (PL), que concorre à reeleição, e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Existe a ameaça real do presidente da República de não aceitar o resultado das eleições caso seja derrotado, alegando fraude nas urnas eletrônicas. Todos os dias, incluindo o próprio Bolsonaro, alguém do governo atenua essa ameaça. Mas ela existe, é real e as redações estão preparadas para o que der e vir. Quando comecei a trabalhar em redação, em 1979, o repórter tinha no mínimo uns cinco anos para aprender a escrever, apurar os fatos e fazer as suas fontes antes de ser jogado na linha de frente da reportagem. Nos dias atuais eles saem nas faculdades, entram na redação e têm menos de 24 horas para aprender a prática da profissão. Apesar de tudo isso, a cobertura que estão fazendo está legal. Nas vésperas de um grande acontecimento, os botecos frequentados por jornalistas ficam muito interessantes, porque é ali na mesa, na medida em que as garrafas vazias vão se empilhando, que sobe o volume das conversas.
Existe uma espécie de consenso entre os jornalistas de que as manifestações prometidas pelo presidente da República para o Dia da Independência podem dar uma ideia do que vai acontecer nas eleições. Tenho dito, escrito e discutido nas palestras que faço online com colegas em redações pelo interior do Brasil: a história que nós temos de Bolsonaro é que ele força a corda até o limite e depois recua, como fez no Dia da Independência do ano passado – há matérias na internet. Um dos motivos do recuo é que ele tem três filhos parlamentares: Carlos, vereador do Rio, Flávio, senador pelo Rio de Janeiro, e Eduardo, deputado federal por São Paulo. Portanto, se tentar tomar o poder na marra acabará preso e destruindo a carreira dos filhos. Toda a carreira dele é baseada no blefe. Mas há um fator novo nessa situação que merece a atenção da imprensa, que são os dois pilares de apoio político do governo. São os 6 mil militares (ativa, reserva e reformados) de várias patentes que estão trabalhando no governo, representados pelo general da reserva Braga Netto, candidato a vice na chapa de reeleição. Eles nunca ganharam tanto dinheiro como nos dias atuais devido a arranjos feitos na legislação pelo presidente da República, que permitiram que os ganhos nas Forças Armadas fossem somados aos salários pagos pelos cargos que ocupam atualmente, furando o teto dos servidores públicos federais, ao redor de R$ 40 mil. E os parlamentares do Centrão que foram beneficiados com o “orçamento secreto”, um truque contábil que permite usar uma verba que soma mais de R$ 8 bilhões em emendas parlamentares sem explicar o seu destino. Até agora os militares no governo e os parlamentares do Centrão não só concordaram com a estratégia de Bolsonaro como trabalharam para que ele acontecesse.
A pergunta que se faz necessária. Diante da real possibilidade de perderem seus ganhos, os militares no governo e os parlamentares do Centrão deixarão Bolsonaro recuar na hora decisiva? Lembro os colegas que eles não estão nessa jogada por simpatia ideológica ou qualquer outra coisa. Estão pelo dinheiro. Toda essa história é simplesmente um negócio para eles. É do jogo. Pelas pesquisas, 80% dos eleitores que já declararam voto em Lula e em Bolsonaro não têm intenção de trocar de candidato. Esse percentual é inédito. A eleição deverá ser decidida pelos indecisos, que representam 35% do eleitorado. Trocando em miúdos toda essa conversa sobre pesquisas. Só saberemos quem será o presidente do Brasil no final da apuração. Ainda bem que o sistema de votação é eficiente e conheceremos o resultado horas depois do fechamento das urnas. Uma recomendação aos jovens repórteres que estão estreando na cobertura de eleições. A história do que vai acontecer será contada pelas matérias que vocês vão publicar. É uma baita responsabilidade. Setembro será um longo mês.