Repórteres, prestem atenção no documentário feito pelo MP de Cachoeira

A promotora Maristela apresenta uma situação que não pode ser ignorada pelos repórteres. Foto: Comunicação Social MPRS

Como se fosse uma professora, a promotora de Justiça Maristela Schneider apresenta às novas gerações de repórteres um relato feito de maneira contundente, simples e direto do cotidiano de privações, ameaças de morte, torturas e sentimento de abandono pela família dos moradores de casas geriátricas de Cachoeira do Sul, uma cidade agroindustrial na Região Central do Estado. A promotora foi muito além de enquadrar os donos das geriatrias na lei. Ela e a sua equipe de trabalho, reforçada por voluntários, conseguiram resgatar a dignidade dos internos. E todo o trabalho foi documentado em um vídeo chamado Projeto Cuidar – Histórias Reconstruídas. Com duração de 15 minutos, o vídeo é um  documentário que merece ser exibido pelos professores nas faculdades de jornalismo e servir de pauta nas redações, ele foi editado pela Comunicação Social do Ministério Público do Rio Grande do Sul –  https://www.youtube.com/watch?v=BCUbUDlfSJ4&t=866s .

Antes de seguir contando a história. Por que recomendei  o vídeo? Vou responder essa pergunta fazendo uma reflexão com os meus colegas repórteres velhos e com os novatos sobre um detalhe no trabalho da promotora Maristela. Ela poderia ter dado andamento a mais um processo de maus-tratos com vulneráveis. Mas ela foi além. Propôs-se a buscar uma saída para as vítimas e fazer disso uma alerta para a comunidade. Aqui lembro o seguinte: as casas geriátricas de Cachoeira misturavam idosos com pacientes portadores de transtornos mentais. Essa prática é antiga. Lembro que, em 1992, eu e os repórteres Nilson Mariano e Ricardo Stefanelli percorremos o Rio Grande do Sul e o Oeste de Santa Catarina, contando a história de idosos e pessoas com transtornos mentais que viviam trancafiadas em lugares insalubres que ostentavam placas de casa geriátrica. Não lembro o título da reportagem. Mas lembro de um senhor que entrevistei em um dessas casas,  em Sapucaia do Sul, Região Metropolitana de Porto Alegre. Ele era um homem alto, de braços fortes, falava de forma pausada e tinha lapsos de memória. Ele havia sido proprietário de uma fazenda na Fronteira Sul do Estado. Familiares o haviam trazido para visitar parentes na Capital e acabaram o internando na casa geriátrica. Lembro também de ter visto idosos e jovens com problema mentais vivendo em quartos  no meio de fezes e comendo comida com cheiro de podre.

O documentário da promotora Maristela mostra que, 26 anos depois, a situação que vi em 1992 não só persistiu como se agravou. E também desapareceu dos noticiários. O documentário nos alerta que devemos voltar a pautar esse assunto. Os donos desses estabelecimentos travestidos de casas geriátricas ganham muito dinheiro com a desgraça alheia. Os internos, sejam idosos ou pessoas com problema de transtornos mentais, ganham um salário do governo federal. Através de uma procuração, os donos dessas casas se apropriam dos ganhos dos internos. O que dão em troca do dinheiro que ganham aos internos é o mínimo. Em momento algum da história, as empresas de comunicação tiveram tanta evasão de anunciantes e assinantes. Há vários estudo mostrando o problema e falando que a a culpa é das novas tecnologias  que criaram plataformas onde sai muito mais em conta, em termos de custo/benefício para os anunciantes. E os leitores estão preferindo buscar as informações em outros meios e deixando os jornais de lado. Tenho dito nas palestras que faço nos jornais pelo interior do Brasil e nas conversas com jovens repórteres que as novas tecnologias não têm as costas tão largas assim para serem responsáveis por tudo de ruim que vem acontecendo com os jornais. Digo que estamos perdendo leitores e anunciantes porque  esquecemos dos problemas que afligem o cotidiano dos nossos assinantes. Como esses problemas descritos pelo documentário da  promotora Maristela.

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