A origem do recurso econômico que irá financiar a eleição do presidente da República e dos governadores dos Estados em 2018 será uma dos mais vigiadas da história do Brasil. Esse é o legado da Operação Lava Jato. Já nas eleições de deputados estaduais, federais e senadores, a história é outra. Os controles são ineficientes devido à dimensão do país – são 27 estados (incluindo o Distrito Federal), divididos em 5.570 cidades – e o enorme número de candidatos que irão disputar 1.572 cargos de deputados (federais e estaduais) e 54 de senador.
Esse é o cenário para as eleições de 2018. E, há duas semanas, eu venho conversando sobre o assunto com pessoas espalhadas pelo Brasil, especialmente pelo interior do país. Falei com marqueteiros, autoridades da Justiça Eleitoral, lideranças políticas de vários partidos e colegas repórteres que conheci durante os 40 anos de profissão nas viagens que fiz na busca de histórias para contar, de ponta a ponta e de lado a lado do país. O meu objetivo aqui é refletir sobre o que vem por aí com os repórteres velhos e fornecer aos novatos na profissão informações que serão úteis para contextualizar nas matérias e, assim, torná-las mais interessantes aos nossos leitores. Vamos começar a conversa.
Por conta das descobertas da Operação Lava Jato, a Justiça Eleitoral colocou uma lupa para fiscalizar a eleição presidencial e de governadores. O trabalho de fiscalização será facilitado pelo fato de os comitês principais ficarem nas capitais do país. Foi exatamente nesses locais que nasceu, cresceu e se consolidou a ilegalidade de usar a aprovação de contas da campanha pela Justiça como maneira de lavar o dinheiro sujo. É opinião geral, entre os marqueteiros com quem falei, que isso não deverá acontecer em 2018, por ser uma prática que se tornou conhecida das autoridades, portanto facilmente detectada. Chamam a atenção também de que, além das autoridades, os comitês estarão sendo vigiados de perto pela imprensa, pelas redes sociais e pelos candidatos concorrentes.
Perante essa realidade que me descreveram, eu perguntei se isso significa que teremos uma eleição sem a participação do dinheiro sujo. A resposta que recebi foi um sonoro “não é possível”. Acrescentaram o comentário sobre uma realidade que conheço bem. Em uma grande parte das cidades do Brasil, o voto tem preço: é trocado por dinheiro, emprego, consulta médica e outros pequenos favores. É o chamado voto de cabresto. E os operadores desse voto são os candidatos a deputado (federal e estadual) e a senador que são ligados às chapas que concorrem a presidente e governador. Nos últimos anos, muitos desses candidatos receberam dinheiro de propinas, descobertas pela Lava Jato. Mas a maior fonte de recursos sempre foi o pequeno comércio da região, os agricultores, os sindicatos (patronais e de trabalhadores), os agiotas e a comissão cobrada das prefeituras pelas emendas parlamentares. Todo esse dinheiro é ilegal por não ser contabilizado na campanha.
E, ao contrário da crença geral, a vigilância sobre esses candidatos deverá diminuir nas próximas eleições. Primeiro, porque as grandes empresas de comunicação se retiraram do interior do país, hoje operam apenas nas regiões metropolitanas. A imprensa do interior tem carência de estrutura, entre outros problemas. E as redes sociais locais são limitadas e partidárias. Segundo, porque as autoridades da Justiça Eleitoral não têm condições de vigiar tanta gente – cada candidato tem vários cabos eleitorais. E, por último, é raro existir a vigilância de um candidato sobre a conduta do outro. Conversei longamente com um calejado delegado da Polícia Federal (PF) sobre essa realidade – a porta aberta ao financiamento ilegal de campanha no interior. Ele chamou a atenção para o crescimento econômico do crime organizado no interior, principalmente nas regiões de fronteira com os países vizinhos. Destacou os grupos de criminosos que lidam com o contrabando de cigarros – hoje uma das atividades ilegais em grande ascensão no país – podem ver na atual conjuntura uma oportunidade de se infiltrar no financiamento ilegal aos candidatos. Isso já é uma realidade no Paraguai.
Mesmo que saia o financiamento público de R$ 3,5 bilhões para os candidatos pagarem suas campanhas, o dinheiro sujo irá continuar irrigando a disputa eleitoral. Isso é um fato que não devemos esquecer. E a nossa contribuição para mudar essa realidade é informando, de maneira exata e simples ao nosso leitor, o que está rolando.