Jair Bolsonaro é o primeiro presidente eleito pelo voto popular que não tem poder para demitir um dos seus ministros. Um fato raro, se não inédito, na história da República. Essa descrição é a que melhor se encaixa a tudo que nós repórteres e comentaristas políticos publicamos nas últimas duas semanas sobre as relações entre Bolsonaro e seu ministro da Justiça e Segurança Pública – há vasto material na internet. O resumo da opera é que Sergio Moro tem mais prestígio popular que o presidente. Por conta da sua atuação como juiz da 13ª Vara da Justiça Federal em Curitiba (PR), na Operação Lava Jato. Os repórteres de meia-idade para frente vão se lembrar da história. Nos anos 1990, popularizou-se na imprensa nacional uma palavra que descreve perfeitamente a situação do ministro Moro: ele é imexível.
A palavra imexível foi incorporada ao dicionário político por Antônio Rogério Magri, um ex-sindicalista alçado à condição de ministro do Trabalho no governo do presidente Fernando Collor de Mello. Collor governou entre 1990 e 1992 e Magri sempre tinha espaço na imprensa porque era mestre em ressuscitar palavras engraçadas. Na ocasião, um repórter perguntou ao ministro se haveria uma redução salarial no país, ao que Magri respondeu: “O salário do trabalhador é imexível”. A palavra caiu no agrado dos jornalistas, que passaram a utilizá-la para descrever diversas situações.
Um dos sinônimos de imexível é intocável, que creio ser o que melhor se ajusta para descrever a atual situação de Moro no governo. Refletindo sobre tudo que tenho lido, visto e escutado a respeito do que acontece entre o ministro e o presidente, a conclusão que chego é que Moro está envolvido em jogo muito perigoso com Bolsonaro. No dia 12 de janeiro, eu publiquei o post “Sergio Moro é J. Edgar Hoover do governo Bolsonaro?” No texto, lembro que, pela sua atuação na Lava Jato, o ministro tem acesso a informações de primeira linha na Justiça, na Polícia Federal (PF) e em outros órgãos governamentais. O que não falei, até porque só tinha ouvido boato e a confirmação veio depois da publicação, é que os filhos do presidente montaram uma espécie de “serviço de inteligência” que atua em toda a máquina administrativa em busca de informações sobre “os inimigos do Bolsonaro”.
Não podemos apontar o dedo e dizer que Moro é um dos inimigos de Bolsonaro. Isso não existe em política. Como diz o dito popular: “O inimigo do meu inimigo é meu amigo”. Mas é importante sabermos quem apoia quem dentro da máquina governamental. Nós repórteres sabemos que construir uma rede de fontes dentro de um governo é complicado. Ainda mais um com o perfil do atual, em que a maioria dos funcionários públicos de carreira está desconfiada das intenções de Paulo Guedes, o ministro da Economia, que de cada dez palavras que fala, em metade defende as privatizações. Ontem (27/01), o presidente falou em “guerra de informações” que estaria sendo travada entre o seu governo e a imprensa tradicional. Digo o seguinte. Todas as avaliações que estávamos fazendo, inclusive a da relação de Bolsonaro com Moro, são lastreadas em números de pesquisas sobre popularidade. O que acontece entre os dois dentro de quatro paredes, eu ainda não vi publicado. Hoje o que estamos publicando é um verdadeiro festival de afirmações baseada, a maioria, em boatos. De concreto, o que existe entre Moro e Bolsonaro é que o ex-juiz condenou o rival político do atual presidente, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT-SP), e largou a carreira para se tornar ministro. Isso é fato. O resto são teses que temos a respeito do que possa estar acontecendo.
Sou de opinião que a imprensa nacional está perdendo o foco na cobertura do governo federal. Estamos dando imensos espaços para “disputas de beleza” e deixando de lado questões fundamentais para o nosso leitor, como é a questão do desemprego. Do colapso da máquina pública, como no caso das filas do INSS. São essas coisas que dizem respeito ao cotidiano do nosso leitor. O resto é conversa que entra em um ouvido e sai no outro. É simples assim.