Sidônio pode até reeleger Lula. Mas não resolverá o problema da comunicação

Extrema direita usa as redes sociais para espalhar mentiras e colocar o governo contra a parede Foto: Reprodução

Na terça-feira (14), o publicitário baiano Sidônio Palmeira tomou posse como ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom), substituindo o jornalista e deputado federal gaúcho Paulo Pimenta (PT), 59 anos. Na solenidade, o novo ministro fez um resumo correto das encrencas enfrentadas na comunicação social pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), 79 anos. São dois grandes problemas. O primeiro é que não consegue reagir com eficiência à enxurrada de fake news disparadas pela máquina de mentiras usada pela extrema direita contra setores estratégicos do governo: segurança pública, saúde, educação e economia. E, segundo, não consegue fazer chegar ao público as notícias sobre o bom desempenho do governo, como a diminuição do desemprego e outros. Ele resumiu muito bem a situação com uma frase muito boa: “Vivemos um faroeste digital”. Se o novo ministro fosse médico, eu diria que fez o diagnóstico perfeito da situação. Mas receitou o remédio errado para o paciente. É sobre isso que vamos conversar.

Para começo de conversa, não tem nada a ver com a competência do novo ministro o fato de não ter receitado o remédio correto. Sidônio é dono de um currículo respeitado. É formado em engenharia e tornou-se marqueteiro em 1992. O principal feito da sua carreira foi ter elegido Lula em 2022, em uma das mais disputadas eleições da história política brasileira. Na ocasião, o atual presidente concorreu contra Jair Bolsonaro, 69 anos, que tentava a reeleição tendo como vice o general da reserva Walter Braga Netto, 67 anos. O remédio do ministro para resolver o problema de comunicação é agilizar os desmentidos das notícias falsas e certificar-se que as informações das obras do governo sejam devidamente divulgadas e cheguem à população. Com este trabalho, ele pode até conseguir reeleger Lula em 2026. Mas o problema na comunicação social continuará a existir no próximo mandato. E nos futuros governos. Porque o problema de comunicação do governo federal não tem a ver com o marketing político de quem está sentado na cadeira de presidente. Tem a ver com a estrutura da comunicação da máquina administrativa federal, que é uma grande bagunça. Um problema que não começou com Lula. Ele vem de longe e seguirá existindo. Tratei desta questão no post de 13 de dezembro de 2024 Demissão de Pimenta é um tiro no mensageiro. Não resolverá o problema. São vários fatores que bagunçam a comunicação do governo. Vou citar os que considero mais relevantes. Na comunicação governamental existem três tipos de jornalistas: o concursado, o de confiança, que é levado ao governo por quem se elegeu, e o terceirizado, que é um funcionário de uma empresa contratada. São três profissionais em conflito permanente. Mais ainda. Nenhum deles têm autonomia para trabalhar, mesmo os que ocupam cargos de coordenador.

A vítima deste sistema são os repórteres que fazem a cobertura do noticiário do dia a dia. Eles ligam para os ministérios em busca de uma informação e ficam pendurados no telefone porque não recebem o retorno para as suas demandas, por mais simples que sejam. O melhor antídoto contra as fake news é facilitar o acesso dos jornalistas às informações. Foi o que aprendi em quatro décadas na lida de repórter, uns 30 e poucos na redação. Mais ainda. Mudou o perfil de funcionamento das redações de jornais, rádios e TVs. Antigamente, estas transformações demoravam décadas para acontecer. Nos dias atuais, o repórter escreve o texto e faz fotos, áudios e vídeos para serem publicados nas várias plataformas da empresa de comunicação. Ou seja, qualquer coisa que dê errado na coleta das informações, ele está ferrado. Na ausência da informação oficial do governo, o jornalista busca as respostas nas redes sociais. Antes, procurava com os colunistas dos jornais, que eram pessoas muito bem informadas. Hoje, os colunistas têm uma imensa carga de trabalho. O que os impede de ter tempo para cultivar boas fontes. A consequência é que a maioria deles está publicando a sua opinião, e não um fato inédito que antes obtinham com as suas fontes. A carência de repórteres, editores e colunistas nas redações abriu um espaço inédito para a influência das empresas de assessoria de imprensa. Lembro-me que quando comecei na profissão, em 1979, o release (texto produzido pelos assessores de imprensa de governos e empresas e enviados às redações) tinha dois destinos: ou ia para a lata de lixo ou virava pauta. Hoje é publicado como matéria. Dentro deste contexto, os sistemas de comunicação social do governo federal ajudam a aumentar o caos nas redações. A consequência? Abrem espaço para o trânsito de um maior volume de fake news.

Para fechar a nossa conversa. Afirmei lá no meio do texto que o problema com a comunicação social do governo federal vem de longe e que seguirá assim por muitos anos. Aqui cabe o seguinte comentário. O que aconteceu de diferente nesta história? As novas tecnologias da comunicação, somadas ao projeto de expansão da extrema direita, profissionalizaram o uso de fake news e do discurso do ódio na disputa política. Esta profissionalização colocou em evidência o caos que é a comunicação do governo federal. Arrumar este sistema dentro da realidade atual é como trocar o pneu de um carro em movimento. Não é impossível fazer. Mas exige planificação e muito trabalho. Quem fizer a arrumação irá mexer com interesses de funcionários concursados, dos que foram trazidos pelo partido do presidente eleito e os terceirizados. E também com as redações. Quem tem tempo e disposição para mexer neste vespeiro?

Deixe uma resposta