Independentemente para que lado for a investigação criminal a respeito dos acontecimentos do entardecer de sábado (13/7), quando o ex-presidente americano Donald Trump (republicano), 78 anos, foi ferido de raspão na orelha por um tiro de fuzil disparado por Thomas Mathew Crooks, 20 anos, ainda é cedo para sair escrevendo que o atentado elegerá o candidato republicano nas eleições de novembro, quando disputará o cargo contra Joe Biden, 81 anos (democrata), que concorre à reeleição. Por seis segundos, Crooks disparou tiros de fuzil AR-15 contra Trump, ferindo, além do ex-presidente, gravemente outras duas pessoas e matando o bombeiro voluntário Corey Comparato, 50 anos, durante um comício em Butler, na Pensilvânia. Até acontecer este atentado, Biden ocupava as manchetes dos jornais por conta do apagão mental que teve no final do mês passado (27/6), durante um debate com Trump, na CNN, em Atlanta, que somado a vários outros episódios de confusão mental colocaram em dúvida a sua capacidade física e cognitiva para disputar as eleições. Desde o debate, aliados do presidente o estão pressionando a renunciar à candidatura. Apesar das pesquisas de intenção de votos apontarem que Trump está apenas três pontos percentuais à frente de Biden na corrida presidencial.
A imprensa americana e a brasileira consideram que o atentado contra Trump foi uma espécie de tiro de misericórdia na candidatura de Biden. E elegeu o ex-presidente. Portanto, tanto faz qual for o destino da candidatura de Biden. Os jornais brasileiros acrescentaram na sua avaliação do caso o exemplo do que aconteceu com o ex-presidente da República Jair Bolsonaro (PL), que sofreu um atentado que contribui em definitivo para a sua eleição em 2018. Concluem que o mesmo acontecerá com Trump. Achei um delírio da imprensa brasileira fazer tal comparação. As histórias políticas dos dois países são bem diferentes. Vejamos. Dos 46 presidentes eleitos nos Estados Unidos, 10 sofreram atentados, sendo que quatro foram mortos. Como os eleitores americanos reagirão nas urnas? No mínimo, é preciso dar um tempo para ter uma ideia do que vai acontecer. Há mais um fato. Trump foi condenado pela Justiça por fraude contábil ao ocultar, durante a campanha presidencial de 2016, quando venceu a candidata democrata Hilary Clinton, o pagamento de 130 mil dólares para comprar o silêncio de uma atriz pornô com a qual manteve um relacionamento – há matérias na internet. Em 6 de janeiro de 2021, o ex-presidente incentivou os seus seguidores a invadir o Capitólio (prédio do Congresso americano), o que resultou em cinco mortes e muitos feridos. O ex-presidente também é um articulador da extrema direita americana, uma das mais organizadas e ricas do mundo. Ou seja, uma coisa era a imagem perante o público do ex-presidente. Outra coisa é a imagem atual, que vem sendo desgastada pelos processos na Justiça e sua caótica administração do país durante a pandemia da Covid-19, quando se posicionou entre os negacionistas.
Tem mais ainda. Seja Biden ou outro candidato, os democratas estão organizados para travar uma disputa voto a voto pela Casa Branca. Estão investindo em convencer os eleitores que a estratégia de Trump, caso vença, será desmontar a estrutura política e social do país de “dentro para fora”. A começar pela saída dos Estados Unidos da cena internacional, rompendo acordos com outros países, como fez no primeiro mandato. A respeito da investigação criminal. Enquanto fazia os disparos, Crooks foi morto por um sniper (atirador de elite) do Serviço Secreto. As investigações vão esclarecer os motivos do atentado e se o atirador agiu sozinho – há dezenas de matérias atualizadas sobre o assunto na internet. Todos os líderes mundiais condenaram o atentado. E foram solidários com ex-presidente. O presidente Biden disse que não há lugar para essa espécie de violência nos Estados Unidos. Aqui é o seguinte. As eleições americanas acontecem em um cenário no qual existe uma reorganização dos movimentos de extrema direita ao redor do mundo. E eles torcem e trabalham pela eleição de Trump. No Brasil, em especial, os bolsonaristas alimentam a crença que a eleição do ex-presidente americano abrirá caminho para que Bolsonaro consiga ser anistiado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que o tornou inelegível por oito anos. Como Trump faria isso, se o Brasil é um país soberano? Todos sabem disso, mesmo os bolsonaristas raiz. Mas criam e alimentam essa história para manter as base mobilizadas. Uma provável eleição do ex-presidente americano bagunçará mais a Europa do que a América do Sul. Porque os 32 países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) estão envolvidos no fornecimento de armas e dinheiro para a Ucrânia financiar a guerra contra a Rússia. Trump é contra os Estados Unidos estarem pagando a conta dos acordos feitos pelos demais países da OTAN. Se ele retirar o dinheiro americano da jogada, a Ucrânia não tem como resistir aos russos.
Para arrematar a nossa conversa. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Explico. É uma obrigação se posicionar contra a violência do atentado sofrido por Trump. Agora, prever que o atentado elegeu o ex-presidente é outra história. Os fatos ainda são muito recentes para fazer tal previsão. Aqui lembro os colegas do seguinte. Antes de existirem as redes sociais e as bem montadas e eficientes fábricas de fake news, as análises sobre o futuro de acontecimentos ficavam restritas aos leitores dos jornais. Hoje, essas análises são transformadas em verdades pelas fábricas de fake news e ficam rodando pelas redes sociais como “o jornal tal disse que o Trump já venceu as eleições”. Nos dias atuais, uma hipótese se torna uma verdade em um estalar de dedos. Lembramos que Trump e o seu assessor Steve Bannon, que cumpre pena por desacato ao Congresso, montaram e operaram uma poderosa máquina de fake news nas eleições de 2016. A imprensa não pode baixar a guarda com o ex-presidente dos Estados Unidos. Ele é um profissional da mentira.