Há coisas que foram ditas nas entrelinhas das reportagens, na ocasião do impeachment da presidente da República Dilma Rousseff (PT – RS), que precisam ser escritas às claras e com precisão para o nosso leitor, na atual situação do Brasil, onde o sucessor de Dilma, o seu vice, Michel Temer (PMDB – SP), pode perder o seu cargo nos próximos 10 dias. Ele pode ser substituído pelo presidente da Câmara Federal, Rodrigo Maia (DEM – RJ). Temer foi denunciado por corrupção pelo Ministério Público Federal (MPF), e o seu destino deverá ser decidido pelo plenário da Câmara.
Dilma foi acusada de ter feito “pedaladas fiscais” – empréstimos em bancos públicos sem autorização do parlamento para cobrir o rombo dos gastos públicos. Foi decisivo para o impeachment a conspiração do grupo político de Temer, aliado com o deputado federal Rodrigo Maia e o senador Aécio Neves (PSDB – MG). O principal pilar da conspiração foi encurralar a já carente economia do país, que precisava da aprovação da Câmara de medidas para reequilibrar as contas governamentais. Com o apoio do então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB – RJ), todas as medidas governamentais foram barradas. E, em seu lugar, Cunha propunha as chamadas “pautas-bomba” – aprovação de projetos que aumentavam as despesas do governo. Cunha foi cassado e, hoje, condenado a 15 anos de prisão pelo juiz Sérgio Moro, da Operação Lava Jato, ele cumpre pena na Região Metropolitana de Curitiba (PR).
O custo econômico da conspiração nunca foi calculado. Ali, e aqui, alguns economistas o mencionaram, sem se aprofundar no assunto. E nós, repórteres, também não corremos atrás para saber. O fato é que o aprofundamento da crise, provocado pela conspiração, serviu como uma luva para a bandeira empunhada por Temer ao assumir o governo. Ele assume com a missão de fazer reformas – Previdência Social e das Leis Trabalhistas –, com o objetivo de colocar a economia nos trilhos. Nas dezenas de entrevistas dadas por Temer, Rodrigo Maia e Aécio, eles defendem as reformas, mas não lembram que a conspiração para derrubar Dilma contribuiu para a formação do atual exército de 14 milhões de desempregados.
Temer morreu pelas próprias mãos, como se diz no jargão das redações. Ele foi gravado pelo empresário Joesley Batista, um dos donos da JBS e delator da Lava Jato, acertando o recebimento de propina. E um de seus assessores, o ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) foi filmado por agentes da Polícia Federal (PF), em São Paulo, recebendo uma mala com R$ 500 mil de suborno. Temer veio a público defender-se, usando como argumento o fato de que estava sendo vítima de uma conspiração contra o seu governo e que está tirando a economia do buraco. Como assim? Ele ajudou a jogar a economia no buraco. Contou com ajuda de Maia, que foi citado em delações premiadas à Lava Jato. E com a colaboração do senador Aécio, que perdeu o mandato por duas semanas, por conta do seu envolvimento no recebimento de propina da JBS.
Se o plenário da Câmara decidir que o presidente pode ser processado pelo STF, ele é afastado por até 180 dias, e assume em seu lugar Rodrigo Maia. Caso se confirme o seu afastamento, acontece uma eleição indireta para o cargo de presidente, em que Maia está sendo apontado como o candidato natural, em nome da estabilidade econômica do país. Emissários de Maia espalharam pelos noticiários e pelas redes sociais que ele irá manter a atual equipe econômica, comandada pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Aqui chegamos a um nó da história que precisamos explicar muito bem aos nossos leitores. O nome do nó é Meirelles, um homem que conhece profundamente a economia brasileira: foi presidente do Banco Central (2003 a 2011) no governo do Lula e tem laços fortes com os banqueiros internacionais.
Vamos olhar o futuro. Maia tem pés de barro, um jargão usado por policiais para dizer que a pessoa responde a crimes. Ele já foi citado em delação premiada de empreiteiros à Lava Jato. E vem aí a delação de Cunha. Ela irá respingar em Maia, que foi um aliado do ex-presidente da Câmara. Até onde se sabe, Meirelles não tem bronca com a Lava Jato. E, do que se tenha conhecimento, ele também não participou ostensivamente da conspiração para derrubar Dilma. Ele nunca escondeu o seu desejo de ocupar o cargo de presidente da República. Inclusive esteve cotado para ser vice da Dilma. O somatório de tudo isso: Meirelles vai dar uma rasteira em Maia e pode ser o próximo presidente da República, eleito indiretamente.
Se Meirelles for eleito, será em nome da estabilidade econômica, uma bandeira dos conspiradores. Isso nós temos que explicar de maneira simples e direta para o nosso leitor, que está encurralado com medo de perder o seu emprego ou faz parte parte do exército de 14 milhões de desempregados.