
Duas histórias que têm pontos comuns viraram manchete nos jornais e são uma oportunidade para a imprensa explicar aos seus leitores os rumos que a disputa política sinaliza para as eleições de 2026. A primeira história aconteceu na quinta-feira (8). O deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), 28 anos, viralizou nas redes sociais um vídeo de seis minutos com a sua versão do escândalo do roubo de aposentados e beneficiários do Instituto Nacional do Seguro Nacional (INSS). O vídeo já teve mais de 130 milhões de visualizações e encurralou o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), 79 anos. A exemplo do que já tinha feito em janeiro passado, quando sua versão mentirosa sobre o Pix teve 330 milhões de visualizações. A segunda história aconteceu na sexta-feira (9). O governador gaúcho Eduardo Leite, 40 anos, saiu do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), ao qual era filiado havia 24 anos, e assinou ficha no Partido Social Democrático (PSD), do experiente articular político Gilberto Kassab, 64 anos. A intenção de Leite é concorrer à Presidência da República. Vai disputar a indicação do partido com outros três candidatos, os governadores de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), 49 anos, do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), 44 anos. e de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), 75 anos.
Dito isso, vamos a nossa conversa. Mas antes um esclarecimento. Não me lembro de ter visto, numa campanha eleitoral, um candidato falar mal de si e bem do adversário. Isso não existe. Portanto, a mentira a que me refiro é aquela que a Justiça considera crime. Voltamos à conversa. As histórias de Nikolas Ferreira e Eduardo Leite se cruzam em vários momentos. Vou citar o que considero mais relevante. Os vídeos com versões mentirosas postados por Nikolas são o início de uma nova era na política brasileira. E a saída do governador gaúcho do PSDB é o fim de uma outra. Se for do interesse do leitor, informações sobre a história do Pix e do escândalo no INSS estão disponíveis na internet. Vou centrar a conversa na disputa política. No ano passado, na campanha eleitoral dos Estados Unidos, o então presidente Joe Biden (democrata), 82 anos, reclamava que o seu adversário, Donald Trump (republicano), 78 anos, era um grande mentiroso. Trump ganhou as eleições e teve o cuidado de só colocar no seu governo pessoas de sua estrita confiança para evitar ser boicotado como foi no seu primeiro mandato (2017 – 2021). Trocando em miúdos. Todos no governo apoiam as duas grandes mentiras que Trump contou para o mundo: a de que os imigrantes ilegais são um bando de bandidos, que inclusive comem os pets dos americanos. E que os países amigos e inimigos dos Estados Unidos inventaram a globalização da economia para saquear os americanos.
Trump tomou posse no dia 20 de janeiro. Nos seus primeiro 100 dias de governo transformou o mundo em uma imensa e perigosa confusão, como a imprensa tem documentado. Em fevereiro, publiquei o post Técnica de mentir de Trump será usada pela extrema direita em 2026 no Brasil. Evidentemente que será usada. E o candidato que Nikolas Ferreira apoiar será um grande problema para Lula em sua tentativa de reeleição. Por quê? A resposta é simples. De todos os parlamentares que usam as redes sociais para contar a sua versão dos fatos, Nikolas é o mais competente. No caso do escândalo do INSS, ele usa como matéria-prima para o seu vídeo fatos publicados pela imprensa. A mentira que ele conta é na relação que diz existir entre os fatos, e que na realidade não existe. Essa técnica não é nova. Foi muito usada durante a ditadura militar (1964 a 1985) no Brasil pelo extinto Serviço Nacional de Informações (SNI). A novidade é a maneira como o deputado conta a sua versão. Ele usa um tom de voz que lembra a sonoridade das antigas radionovelas. Interpreta o texto como se fosse um ator. Na história do INSS, no final a sua imagem foi envelhecida para lembrar os aposentados. Andei pesquisando a vida política do deputado. Ele é ligado ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), 70 anos, e entrou na política em 2020 como vereador de Belo Horizonte (MG). No início da carreira, seguiu ao pé da letra o manual dos bolsonaristas. Usou as redes sociais para xingar, humilhar e contar mentiras sobre os seus adversários políticos e as minorias sociais e raciais. Nos dias atuais está no ápice da carreira. É considerado o deputado federal mais influente nas redes sociais no Brasil. Até onde irá esticar a corda nas eleições de 2026? Ele é advogado e sabe que as leis brasileiras e as americanas são diferentes. Os constituintes brasileiros fizeram a Constituição em 1988, que garante que o golpe de 1964 não irá se repetir. Os americanos nunca tiveram um golpe militar.
Como disse lá no começo da nossa conversa, a saída do governador gaúcho do PSDB significa o fim de uma era na política porque o partido deixará de existir. Deverá fazer uma fusão com o Podemos, afirmou Marconi Perillo, 63 anos, ex-governador de Goiás e presidente nacional do PSDB, que tem como símbolo um tucano e como número o 45. Com a fusão, o 45 será extinto. Os tucanos surgiram de um racha que houve no MDB em 1988 – material sobre o assunto na internet. Uma das suas principais estrelas foi o ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso, atualmente com 93 anos. FHC, como é conhecido, governou o país de 1995 a 2003, quando passou a faixa presidencial para Lula (2003 – 2011). Faz parte da política brasileira a história de que Lula deu prosseguimento às medidas econômicas e os projetos sociais de FHC. Até o governo (2011 – 2016) de Dilma Rouseff (PT), 77 anos, o PSDB polarizou com o PT a disputa pela Presidência da República. Em 2010, Dilma ganhou a eleição contra o tucano José Serra 83 anos. Na reeleição, em 2014, ela venceu Aécio Neves, 63 anos, na época uma estrela em ascensão dos tucanos.
É fundamental para os repórteres conhecerem o perfil da política deste período. A disputa era acirrada como é nos dias de hoje. Mas havia respeito aos grandes interesses da população. Há várias teses para explicar esta situação. Uma delas é que o país tinha passado por um trauma provocado pelos 21 anos de ditadura militar que deixou um rastro de pessoas torturadas, desaparecidas, mortas e presas ilegalmente, além de uma hiperinflação. Tudo começou a mudar com a eleição de Trump em 2016. Um dos seus assessores, Steve Bannon, 71 anos, montou uma máquina de fake news copiada da Alemanha nazista dos anos 30 que foi decisiva para a vitória de Trump. A máquina foi aperfeiçoada por Bolsonaro, que foi eleito presidente em 2018. Esta ruptura na maneira de fazer política foi tão violenta que encorajou Bolsonaro a tentar um golpe de estado em 2022, após ser derrotado por Lula nas urnas. E atualmente tentar aprovar uma lei que anistia os golpistas. Fazer todas essas ligações é fundamental para explicar ao leitor o que vem por aí.