
Na manhã de quarta-feira (26/03), no segundo e último dia do julgamento da denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro relator Alexandre de Moraes, 56 anos, avisou que ia dizer um clichê: “uma imagem vale mais que mil palavras”. E para demonstrar exibiu um vídeo que resumiu as ações violentas dos seguidores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), 70 anos, que, em 8 de janeiro de 2023, deixaram os acampamentos que mantinham na frente de unidades militares e invadiram e quebraram tudo que encontraram pela frente no Palácio do Planalto, no Congresso e no STF, em Brasília (DF). Além de outros vídeos e mensagens trocadas entre os golpistas. No final da audiência, os cinco ministros da Primeira Turma do STF aceitaram a denúncia do procurador-geral da República, Paulo Gonet, 63 anos, e por unanimidade e de maneira inédita tornaram réus o ex-presidente e as mais sete pessoas que ocupavam cargos de primeiro escalão no seu governo (um almirante, dois delegados da PF e três generais e um tenente-coronel do Exército). Vamos conversar sobre os vídeos e as mensagens de texto e áudio.
Mas antes vamos seguir o manual do bom jornalismo e contextualizar a história. Em 2022, Bolsonaro concorreu à reeleição e perdeu para Luiz Inácio Lula da Silva (PT), 79 anos. Ele e seus seguidores mais próximos, que faziam parte do seu círculo pessoal, colocaram em prática um plano que tinha como objetivo semear vários episódios de violência para desestabilizar o país e dar um golpe de estado, impedindo que Lula assumisse o governo. Os agentes da Polícia Federal (PF) investigaram o caso e produziram um relatório que foi entregue ao STF, que por sua vez o enviou para a PGR. Com base na investigação, Gonet, em um documento de 272 páginas, denunciou ao STF, por tentativa de golpe de estado, Bolsonaro e outras 33 pessoas (sendo 27 militares da ativa, reserva e reformados). O caso foi para a Primeira Turma do STF, que é composta pelo relator Moraes e mais quatro ministros. Os 34 denunciados foram divididos em três núcleos. O primeiro, formado por Bolsonaro e outras sete pessoas, foi julgado nos dias 25 e 26. O segundo será nos dias 8 e 9 de abril. E o último, em 28 e 29 de abril. No julgamento, em resumo, os ministros tinham dois caminhos: ou arquivar a denúncia ou aceitá-la e tornar os denunciados réus. Decidiram transformar os oito em réus. Terminada a contextualização, vamos voltar a nossa conversa.
Os meus colegas disseram, e eu concordo: o dia 26 de março vai entrar na história política do Brasil. É a primeira vez que envolvidos em uma tentativa de golpe, incluindo militares, vão a julgamento. O acompanhamento dessa história é para o jornalismo diário. Como disse no final do primeiro parágrafo: vamos conversar sobre os vídeos, as mensagens de texto e os áudios. Antes vou lembrar três posts que publiquei. Em julho de 2024, Por que Bolsonaro semeou provas contra o seu governo, como o áudio da Abin paralela?, em novembro de 2024, PL da anistia aos golpistas não conseguirá apagar as imagens do 8 de janeiro, e, por último, em fevereiro de 2025, A imprensa e a tecnologia usada na investigação do golpe dos bolsonaristas. Desde novembro de 2022, quando começaram os episódios que tinham como objetivo espalhar a confusão no país e dar o golpe de estado, tenho defendido que as novas tecnologias de comunicação acabaram com os segredos entre quatro paredes. Sempre tem uma câmera de segurança, um celular, um drone ou algum outro equipamento documentando os acontecimentos. A delação premiada para a PF feita pelo ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, 45 anos, ajudou muito na investigação. Há poucos anos, uma delação premiada precisava ter muitas provas físicas para se sustentar. E conseguir provas físicas era muito difícil. Nos dias atuais, graças às novas tecnologias, a coleta dessas provas foi muito facilitada. Por conta disso, há uma montanha de provas materiais contra os suspeitos dos atos golpistas, como é o caso das imagens do 8 de janeiro de 2023. Em outros tempos, a conspiração para um golpe ficaria perdida no tempo. Lembro que até hoje ainda estamos descobrindo fatos inéditos sobre os conspiradores que deram o golpe militar em 1964. Aqui é o seguinte. Assim como as novas tecnologias espalham as versões dos candidatos e os elegem para cargos políticos, elas também tornam públicas as sacanagens que os complicam perante a lei.
Bolsonaro e os outros sete que foram declarados réus estão sendo acusados por cinco crimes, entre eles formação de organização criminosa. Se foram condenados, podem pegar até 40 anos de prisão. O ex-presidente esteve na audiência de terça-feira (25/03) e sentou-se na primeira fileira. Há uma discussão na imprensa sobre o motivo que o levou ao STF. Foi lá para provocar o ministro Moraes, de quem fala mal sempre que tem uma oportunidade? Ou simplesmente demonstrar que não tem medo? Seja qual for o motivo, ele não esteve no STF na audiência do dia seguinte (26/03). Em vez disso, foi ao Congresso, e logo após o encerramento do julgamento, convocou a imprensa para uma conversa. Falou mais de uma hora, com transmissão ao vivo pelas redes de TV a cabo e pelas redes sociais. Deu a versão dele sobre a decisão dos ministros de torná-lo réu. Resumindo em poucas palavras a defesa de Bolsonaro: foi vítima de uma conspiração que envolve Lula e os ministros do STF. Ele pode até conseguir convencer alguns dos seus seguidores com a sua versão. Mas o fato é que existe uma vastidão de provas materiais obtidas com as novas mídias que o ligam à tentativa de golpe, muitas delas contadas pelo seu ex-ajudante de ordens. O ex-presidente e os outros sete réus são defendidos por advogados experientes e de primeira linha. A missão deles é convencer os ministros que os vídeos, as mensagens e as demais provas não têm nada a ver com uma tentativa de golpe. Mas, como lembrou o ministro Moraes, “uma imagem vale mais que mil palavras”.