De quem é a responsabilidade pelo suicídio do reitor da UFSC já que o relatório da PF é frágil e inconclusivo?

Quem será responsabilizado na PF pela morte do reitor da UFSC? Foto: arquivo pessoal

A montanha pariu um rato. Assim pode ser definido o resultado de sete meses de investigações da Polícia Federal (PF) na Operação Ouvidos Moucos. No ano passado, a PF começou, e concluiu em abril, a apuração do desvio de dinheiro dos cursos de Educação a Distância (EaD) na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Na ocasião, foram presos seis funcionários, entre eles o então reitor, Luiz Carlos Cancellier, 59 anos. Ele foi algemado (pés e mãos) e ficou em um presídio por um dia. Foi solto com uma série de restrições, entre elas não entrar na UFSC. Dias depois de ser solto, Cancellier pulou do último andar do Beiramar Shopping, um dos endereços elegantes de Florianópolis. No seu bolso, foi encontrado pela Polícia Civil um bilhete explicando as razões do suicídio – há uma abundância de matérias disponíveis na internet. A qualidade da investigação da PF é contada na reportagem A Segunda Morte, dos repórteres Monica Weinberg, Luisa Buscamante e Fernando Molica, na edição da revista Veja do último fim de semana de abril. Os repórteres tiveram acesso às 6 mil páginas do inquérito policial. E às 800 páginas do relatório final da investigação. A reportagem mostra a fragilidade da investigação que resultou no suicídio do reitor. No ano passado, em oito de outubro, fiz o post “Qual é a responsabilidade dos repórteres no suicídio do reitor da UFSC ?” Ali refleti com os colegas calejados e os novatos uma questão que considero um dos fatores responsáveis pela fuga dos assinantes dos jornais: a vulnerabilidade a que estão expostas as redações atuais, devido às demissões em massa que retiram da reportagem a capacidade de fazer a própria investigação, deixando os noticiários dependentes das fontes oficiais. O caso do suicídio do reitor é uma prova material do que falei.

Nós, repórteres, podemos ser vítimas da desestruturação das redações. Não cúmplices. Lembrei no post e alertei para o seguinte: “Para sabermos com exatidão qual foi a nossa responsabilidade no suicídio do reitor, a resposta não vai ser encontrada no que publicamos. Mas no que não publicamos.” E uma parte do que não publicamos é exatamente o que derruba o resultado da investigação da PF. A maioria de nós não publicou porque não sabia e não tinha como apurar devido à carência de dinheiro e pessoal nas redações. Temos que lembrar um fato. Toda a investigação que envolve apuração de rolos dentro de universidades, principalmente nas federais, tem um componente chamado de disputa pelo poder entre os professores. Como repórter, participei de várias apurações desse tipo que foram dificílimas por envolver disputa política e vaidade entre os docentes. No caso de Santa Catarina, lembra a reportagem de Veja, há outro componente importante, acrescentado pelo suicídio do reitor. A pressão sobre a PF para apresentar resultados. Eu acrescento mais um: todo repórter que trabalha com investigação sabe que existe uma velha briga na PF entre os agentes e os delegados. Explico: na Polícia Civil, sempre que o delegado não está ou não quer falar com a imprensa, o chefe de investigação, que, geralmente, é um inspetor, fala. Na PF, só o delegado pode falar. Os agentes só falam em off. O delegado da PF é um pequeno reizinho na sua delegacia. Esse papel de reizinho foi reforçado pela Operação Lava Jato, que transformou os delegados federais em personagens de filmes.

No que irá resultar a apuração feita na Operação Ouvidos Moucos, ainda é cedo para dizer. É preciso esperar o MPF se pronunciar sobre o assunto. Mas uma coisa é certa. Apuração é responsável pela morte do reitor, isso ninguém discute. A primeira frase que usei para começar a contar essa historia foi “A montanha pariu um rato”. A expressão foi cunhada pelo pensador latino Horácio (Quinto Horácio Flaco, poeta e satírico da Roma Antiga, falecido em 65 a.C.), e significa que uma operação grandiosa resultou em um resultado pífio. Nas redações, essa frase é usada para explicar quando um grande trabalho de investigação descobre que não existia nada do que se imaginava. Se insistir em valorizar o que não tem valor, acaba-se cometendo um dolo. É o caso da investigação da PF sobre os desvios na UFSC?  Quem vai responder a pergunta é a Corregedoria da PF.

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