Merecia ter sido melhor contextualizada e explicada para os leitores a decisão do ministro e vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux sobre as limitações impostas pela Constituição Federal ao presidente da República no uso das Forças Armadas. A notícia acabou caindo na vala comum e coberta pela avalanche de acontecimentos que mereceram manchetes na última semana. Não é para menos. Os brasileiros vivem atordoados por uma crise sanitária causada pelo coronavírus, que já matou (13/06) 42.791 pessoas e infectou 840.796. Enquanto isso, os grupos políticos que dão sustentação ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) estão engalfinhados em uma guerra suja para se manter no poder. O mundo também está complicado. Ao mesmo tempo em que o coronavírus faz vítimas em vários países, com 425.282 mortes e 7.632.517 infectados, a morte covarde do desempregado negro George Floyd (25/05) por um policial branco nos Estados Unidos espalhou protestos pelos quatro cantos do planeta, inclusive no Brasil. Usando a linguagem dos editores dos jornais (papel e sites): então por que a notícia do ministro Fux merece ser melhor explica?
Ouvi essa pergunta centenas de vezes em minha vida como repórter. Tenho 69 anos, 40 e profissão e fiquei uns 30 e poucos na redação. Aprendi na lida da reportagem que a melhor maneira de convencer um editor a “manchetear” a tua matéria é dizer-lhe o seguinte: “Se não fizer, tu vais ler no concorrente”. Vamos à resposta. O blefe do golpe militar causa tanto dano para os brasileiros quanto as fake news disparadas pela máquina de distorcer a verdade instalada no Gabinete do Ódio, como é chamado o círculo íntimo formado pelas pessoas ao redor do presidente da República. Desde o dia que colocou a faixa de presidente do Brasil no peito, o capitão da reserva do Exército Bolsonaro usou o blefe da ameaça de um golpe militar como ferramenta na disputa política para assustar os seus adversários e principalmente os brasileiros que viveram durante os governos militares (1964 a 1985). Além de assustar os brasileiros, o blefe passa uma mensagem à comunidade financeira internacional de instabilidade política e afasta os investidores. Como aconteceu em abril (19), quando Bolsonaro se juntou a um grupo de seus apoiadores e foi até a frente do Quartel-General do Exército, em Brasília (DF), pedir a volta dos militares ao poder. Os manifestantes também pediam o fechamento do Congresso e do Judiciário.
O blefe é reforçado a cada vez que um general é chamado pelo presidente para o governo. Hoje, somam 3 mil oficiais e graduados da reserva e da ativa das Forças Armadas e das policiais militares. Um número jamais visto na história do país. Publicamente, o presidente, o seu vice Hamilton Mourão e os generais no governo jamais admitiram o golpe. Sempre pregaram o respeito à Constituição. Mas também nunca deixaram de advertir, de uma maneira direta ou nas entrelinhas, que poderiam usar os militares em caso de impasse entre os três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário. Eles não podem fazer isso, o assunto está regulamentado na Constituição de 1988. Na sexta-feira (12/), respondendo à Ação Direta de Inconstitucionalidade (AFDI) 6457, do Partido Democrático Trabalhista (PDT), o ministro Fux deu uma decisão liminar lembrando, em palavras simples, o que está escrito na Constituição. As Forças Armadas não podem serem usadas para resolver impasses políticos entre os três poderes. Muito menos para enfiar goela abaixo do povo uma decisão presidencial. Ou seja: Exército, Marinha e Força Aérea não são o quarto poder da República. Aqui chamo a atenção dos meus jovens colegas repórteres. Bolsonaro e os generais no governo repetirem que vão respeitar a Constituição não é mais manchete há um bom tempo. Se não respeitarem, eles serão presos e perderão os seus postos. E se, por acaso, se envolverem em uma aventura e fomentarem um motim nas tropas e forem para as ruas com os soldados e os tanques, vão ter que enfrentar uma reação da sociedade organizada como jamais sonharam. Lembrem o que aconteceu em maio de 2013? A Manifestação dos 20 Centavos. Usar o blefe e a bravata faz parte do jogo político. Mas o governo Bolsonaro exagera ao tornar o blefe e a fake news pilares da sua administração. Aproximação do governo do Centrão sinaliza que vão começar a trocar generais na administração por civis indicados pelos partidos. Podem anotar.