A imprensa não se deu conta. Mas o senador Sergio Moro ainda não encontrou uma bandeira política que garanta a sua sobrevivência na disputa eleitoral. Isso ficou claro no episódio da ameaça contra a vida dele e da sua família feita pelo Primeiro Comando da Capital (PCC), de São Paulo, e desmontada pela Operação Sequaz, da Polícia Federal (PF), que cumpriu 11 mandados de busca e apreensão e de prisões preventivas em São Paulo e no Paraná na última quarta-feira (22/03). Além de Moro, a lista dos alvos do PCC incluía outras autoridades, como o promotor de Justiça Lincoln Gakiya, que integra o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado de São Paulo (GAECO). Tudo isso seria uma notícia de pé de página se um dia antes da operação, em entrevista para o site de notícias 247, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não tivesse dito que pretendia “f… com a vida do Moro”. E, no dia seguinte à operação, não acrescentasse mais algumas besteiras ao caso. Graças a essas duas intervenções de Lula, o assunto virou destaque de todos os noticiários nacionais e até alguns internacionais.
Não vou discutir o episódio – há matérias em abundância para todos os gostos disponíveis na internet. Vou aproveitar a oportunidade para conversar com os meus colegas, em especial os jovens que estão fazendo o noticiário do dia a dia, sobre os parlamentares (federais e estaduais) e governadores eleitos pelo prestígio político do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Somam mais de 150, e Moro é um dos mais conhecidos. Juiz da 13ª Vara Federal, em Curitiba (PR), foi uma das figuras de proa da Operação Lava Jato, responsável pela prisão de Lula, que era o principal adversário de Bolsonaro nas eleições presidenciais de 2018. Assim que Bolsonaro assumiu o governo, em 2019, Moro abandonou a magistratura e tornou-se ministro da Justiça e Segurança Pública. Brigou com o então presidente e saiu do governo. Reconciliou-se durante a campanha, quando viu que não teria chances de se eleger sozinho. Bolsonaro perdeu a eleição e dois dias antes da posse de Lula foi para os Estados Unidos para não lhe entregar a faixa presidencial. Desde então tem pipocado uma série de escândalos com as digitais dele e do seu círculo íntimo de líderes, como o caso dos atentados terroristas de 8 de janeiro, em Brasília (DF).
Então é o seguinte. Se Bolsonaro voltar ao Brasil e conseguir organizar os seus seguidores, tornando-se uma referência na oposição ao governo Lula, ele tem chance de eleger muita gente nas eleições que vêm por aí, inclusive Moro, caso queira disputar um cargo executivo. Mas se o ex-presidente não conseguir se tornar uma referência da oposição, aqueles que ele elegeu precisarão caminhar com as próprias pernas. Daí a procura de Moro por uma bandeira política que o torne competitivo nas urnas. Vamos examinar algumas hipóteses. Ele se tornar uma referência de oposição a Lula? Não tem café no bule para isso. Deixou muitos rolos na Lava Jato que corroeram o seu patrimônio político. E também não tem a oratória e as ligações políticas de Bolsonaro. Outra alternativa de Moro é ser uma referência na luta contra o crime organizado, em especial o PCC? Esse tipo de assunto não rende manchete nos jornais, a não ser em situações como a crise de segurança pública que atinge a cidade de Natal, capital do Rio Grande do Norte, onde as facções locais estão praticando uma onda de atentatos criminosos – há matérias na internet. A moda, nos dias atuais, é apostar em bandeiras no campo dos costumes, como ser contra o aborto (incluindo casos previstos em lei) e outros assuntos polêmicos. Nesse campo há um congestionamento de parlamentares ligados às igrejas pentecostais. O senador Moro tem discutido a questão da bandeira política com profissionais do ramo. Por enquanto, está atirando para todos os lados. Conversei com gente especializada em orientar a carreira de parlamentares e ouvi uma especulação esquisita, que é a seguinte: baseado na história do ex-presidente, que conseguiu se manter na vida parlamentar por três décadas tendo como base eleitoral os militares que atuaram no golpe de estado dado pelas Forças Armada (1964 a 1985), os saudosistas desse período e seus familiares, a ideia é que Moro tentasse formar uma base entre o pessoal aposentado da Justiça e aqueles que lutam pelo aumento do quadro de servidores do setor. Achei esquisita a ideia pelo singelo motivo que o contingente de aposentados da Justiça é bem menor que o dos militares. Mais: entre os militares brasileiros existe a cultura do golpe de estado, que sempre foi defendida por Bolsonaro. Entre o pessoal da Justiça não existe tradição do golpe de estado.
O fato é o seguinte. O ex-juiz tem uma equipe altamente profissional prospectando um caminho que ele possa percorrer e se manter competitivo nas urnas. O que aconteceu com a história do PCC mostra que as pessoas que estão assessorando Moro estão muito bem organizadas e atuantes. A prova disso é que Lula deixou a bola picando e eles chutaram a gol com uma precisão muito grande. O mesmo não está acontecendo com o general da reserva Hamilton Mourão, ex-vice-presidente de Bolsonaro, que se elegeu senador pelo Rio Grande do Sul graças ao prestígio do ex-presidente. Moro e Mourão têm em comum o fato de estarem seus primeiros mandados parlamentares. O general também procura uma bandeira para defender. Mas por hora a ideia que transmite é de que está perdido. E não está trabalhando para descobrir qual rumo deve tomar para ter uma base eleitoral. Poderia ficar falando sobre esse assunto por muito mais tempo. Mas prefiro encerrar a nossa conversa por aqui. Não sem antes chamar a atenção dos colegas que poucas eleições atrás os eleitos chegavam ao parlamento, ou a um cargo executivo, só depois de terem montando as suas bases eleitorais. Ser eleito por um puxador de votos era uma exceção e hoje está se tornando uma rotina, graças às novas tecnologias de comunicação.