Márcio Pinheiro*
Está faltando um famoso repórter nessa história. Só um cobra da reportagem conseguiria desvendar o mistério das cobras que estão infestando a área da capital federal e se reproduzindo numa escala maior do que as vítimas de covid19.
A história por si só já é fantástica mas ainda por cima ela se desdobra (ou se enreda, para continuar na comparação ofídica) em tantas outras histórias tão ou mais fascinantes.
Tudo começou no último dia 7, quando Pedro Henrique Santos Krambeck Lehmkul, 22 anos, estudante de Medicina, foi picado por uma naja. Só aí surgem várias perguntas:
1. Como uma cobra como essa, encontrável apenas em determinadas regiões da África e da Ásia, foi parar em Brasília? Tudo indica que foi tráfico de animais, já que até o momento apareceram outras 16 cobras de igual origem.
2. E como elas entraram no país, já que exige o envolvimento e a conivência de dezenas de pessoas?
3. Entrando, como é possível manter uma cobra dessas?
4. Ela fica confinada ou em espaço aberto?
5. Como fazer para manter sigilo? Quando alguém, de repente, aparece na sua casa, como se deve esconder uma naja?
6. E como alimentar o bichinho? Ração para gatos, cachorros, peixes? Pequenos roedores vivos? Sobras do almoço?
A ousadia de Pedro está lhe custando caro – em todos os sentidos. O tratamento é custoso e, mais ainda, doloroso. De imediato, Pedro desenvolveu necrose no braço e lesões no coração devido ao veneno do animal. Também já passou por uma sessão de hemodiálise. Há seis dias ele segue internado na UTI do Hospital Maria Auxiliadora, no Gama.
A família e/ou os amigos de Pedro não quiseram entregar a cobra para Polícia Militar Ambiental. Preferiram despejá-la em local público, acondicionada numa caixa próximo a um shopping.
7. Seria uma estratégia para que a naja fosse facilmente encontrada, livrando os donos de multa e processo mas permitindo que o animal fosse facilmente recuperado?
A história cresce mais ainda pelo fato de a naja não ser nativa do Brasil. Assim, o Instituto Butantã, único lugar no país com soro antiofídico, que é reservado para pesquisadores que podem ter acidentes com a espécie, teve TODAS as doses do soro enviada para o tratamento de Pedro. A família também comprou mais soro de laboratórios do Estados Unidos. Ainda não chegaram.
Pedro, ainda em coma, pode se considerar um cara de sorte. Há muitos casos de pessoas que morrem uma hora depois do ataque de uma naja. O veneno age diretamente no sistema nervoso central.
A cobra segue no zoológico de Brasília enquanto decidem o que fazer com ela. Porém nenhum profissional do zoo pode interagir com ela porque as únicas unidades do soro antiofídico do país foram para Pedro.Apesar do stress, a naja passa bem.
Repórter