Foi descoberto um elo de uma história que pode ajudar a comunidade internacional a entender como, em um sábado (7/10), 1,5 mil combatentes do Hamas, sem serem detectados, invadiram Israel, país protegido por forças militares perfiladas entre as melhores equipadas e treinadas do mundo. Apoiados por um serviço de informações sofisticado e eficiente, naquele dia, durante horas, os terroristas mataram 1,2 mil pessoas e sequestram 240, a maioria mulheres, crianças e adolescentes, sem serem importunados. Todo o plano de invasão foi elaborado do outro lado do muro que separa Israel do território palestino da Faixa de Gaza, que é governado pelo Hamas. Como tudo isso aconteceu? O elo descoberto é a primeira peça desse quebra-cabeça. Foi notícia, no início do mês, nas páginas do jornal americano The New York Times, a informação de que as autoridades israelenses, incluindo o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, sabiam há mais de um ano dos planos de invasão do país e não agiram por considerar que o Hamas não tinha capacidade para executá-los. Três meses antes da invasão, um agente informou aos seus superiores do serviço de informações que o Hamas estava treinando o seu pessoal para executar o plano. Ninguém deu bola. O plano tem 40 páginas e recebeu o codinome de “Muralha de Jericó”. Nele é detalhado o passo a passo da ação dos terroristas no dia da invasão.
A matéria do Times, reproduzida no Estadão, é muito detalhada e contextualizada. Na maioria das forças armadas ao redor do mundo, incluindo os Estados Unidos, a descoberta de um plano para a invasão do seu território tem grande chance de não ser levada a sério porque não convivem com a ameaça real diária de tal ação bélica. Isso não se aplica às Forças de Defesa de Israel. Desde a sua fundação, em 1948, os israelenses se envolveram em várias guerras com os seus vizinhos – há documentários, reportagens e muito material disponível na internet. E, na última década, pelo menos uma vez por semana o Hamas bombardeia Israel com mísseis caseiros. São imprecisos, mas causam danos e matam. Portanto, é no mínimo estranho que as Forças de Defesa, os serviços de inteligência e o próprio primeiro-ministro israelenses tenham considerado uma obra de ficção o plano do seu inimigo do outro lado do muro. Esse plano é um elo de uma história maior que irá contar o que realmente contribuiu para deixar a fronteira vulnerável, facilitando a invasão do Hamas em 7 de outubro. A garimpagem maior dessa história vem sendo feita pela imprensa, especialmente jornais israelitas. A apuração tem como personagem principal o primeiro-ministro Netanyahu e o seu governo recheado de fundamentalistas religiosos e da extrema direita. Até estourar a guerra, Netanyahu enfrentava uma manifestação popular diária contra a sua intenção de mudar a lei para escapar de acusações criminais.
Os protestos populares terminaram com o início da guerra. O primeiro-ministro tem pregado que vai riscar o Hamas do mapa. A história nos ensina que se isso acontecer, no lugar do Hamas surgirá outro movimento. Essa lógica só será interrompida quando a realidade dos moradores da Faixa de Gaza mudar. Essa mudança pode ser trazida pela estruturação do estado da Palestina, conforme análise feita pelo maior apoiador de Israel, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden (democrata) – há matéria na internet. Houve uma trégua de uma semana, que terminou na sexta-feira (01/12), durante a qual Israel e Hamas negociaram a troca de 100 reféns por 240 palestinos que estava encarcerados em prisões israelitas. Os combates recomeçaram e o destino desse conflito é incerto. Estima-se que já foram mortas 12,4 mil pessoas, a maioria civis palestinos e israelitas. Das poucas certezas que se tem, uma delas é que Netanyahu continuará no poder enquanto houver guerra. A outra é que seguem as negociações quanto ao destino de 140 reféns ainda em poder do Hamas. E, por último, que os bombardeios da artilharia e da aviação de Israel continuam fazendo vítimas civis em Gaza. A respeito desse conflito existe uma espécie de unanimidade entre os jornalistas de que ele não se perfila como apenas mais um na galeria das guerras na região. Um dos motivos é que as populações civis dos dois lados, Israel e Faixa de Gaza, estão documentando e espalhando para o mundo, via redes sociais, o seu sofrimento com a guerra. Esse material é muito valioso para os repórteres terem uma ideia mais precisa do que acontece no campo de batalha.
Para arrematar a nossa conversa. No dia 14 de novembro escrevi o post Perguntas sem respostas para entender a guerra Israel versus Hamas. Considero que a matéria publicada pelo Times sobre o plano da invasão é um passo importante em direção a esclarecer como realmente tudo aconteceu. Lembro os meus colegas que até existirem as novas tecnologias da comunicação, como os atuais celulares, não se tinha acesso ao enorme volume de dados sobre os acontecimentos nos campos de batalha e entre as populações civis que ficam no meio do fogo cruzado dos combates. Perante essa nova realidade, as coberturas dos conflitos oferecerão aos leitores um quadro mais preciso. Lembro que a guerra entre Rússia e Ucrânia está sendo transmitida online pela população e os jornalistas por meio de celulares. O mesmo acontece com o conflito entre Israel e Hamas. O fato é o seguinte: essa nova era das comunicações tornará mais vulneráveis os líderes que usam as guerras para se perpetuarem no poder. Andei vasculhando a internet e consultando cientistas da comunicação em busca de pesquisas sobre o impacto das novas tecnologias na cobertura das guerras. Não encontrei nada significativo. Fui advertido por uma fonte que, por ser fato recente, os impactos ainda estão sendo analisados pelos estudiosos. Lembro-me que, na década de 90, durante a cobertura da Guerra Civil de Angola, na África, encontrei repórteres de vários cantos do mundo e o que existia de comum entre nós era o medo de perder a parafernália de equipamentos usados para transmitir as matérias. Hoje basta um celular.