Projetos diferentes: dos militares de 64 era para o país, de Bolsonaro é para a sua família

O projeto de poder da família Bolsonaro atropela quem fica na sua frente. Foto EBC.

A cada atoleiro político em que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido, RJ) se enfia, nós repórteres conseguimos ver um novo detalhe de como o seu grupo opera para manter o poder. O atoleiro mais recente é a briga dele com seu ministro da Saúde, o médico Luiz Henrique Mandetta. O ministro defende o isolamento social, Fica em Casa, como estratégia para conter a expansão do coronavírus no Brasil. Bolsonaro é contra e quer demitir o ministro. O que temos publicado? Os conteúdos que fizemos nos jornais impressos, sites, vídeos, rádios e TVs mostram que, nas nossas análises, usamos o conhecimento que acumulamos sobre o modo como os militares que deram o golpe em 1964 operavam principalmente na questão da censura à imprensa e nas prisões e tortura de presos políticos. Escrevemos que o funcionamento das instituições – Câmara, Senado, Judiciário – e a liberdade de imprensa impedem que se repita 64. Mas quem disse que Bolsonaro quer repetir 64?

Por tudo que o presidente falou – por exemplo, eleger como herói o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra (falecido 2015), símbolo dos torturadores de 64 –, concluímos e escrevemos nas entrelinhas dos nossos conteúdos que o sonho dele era repetir 64. O sonho dele é bem maior. Vejamos. Antes um alerta. O que vou escrever não é opinião. Vou relatar fatos que publicamos, ali e aqui, e que agora tenho tempo para reler e ficar atento ao que acontece na administração federal. Na sua carreira parlamentar, Bolsonaro abriu espaço nas manchetes dos jornais proferindo absurdos, entre eles a idolatria aos golpistas de 64. Tipo do assunto que damos destaque nos jornais sempre que não se tinha nada mais relevante a publicar. Aqui vamos parar e pensar. Os militares que deram o golpe em 64 eram unidos por uma ideologia e tinham um projeto político e de obras para o país. O poder, no caso a Presidência da República, foi compartilhado entre eles. E as grandes obras, como a Usina Hidrelétrica de Itaipu, a colonização das fronteiras agrícolas (berço do agronegócio), as refinarias de petróleo e grandes rodovias (Transamazônica) e outros empreendimentos, tiveram continuidade.

Os generais e os militares que foram recrutados por Bolsonaro para o seu governo apostaram que a eleição seria o início de uma era aberta pela aprovação das urnas do projeto de 64, claro, sem as arbitrariedades. Estavam enganados. Eles apenas eram figurantes de um novo projeto de governo que tem como espinha dorsal o “culto à personalidade de Bolsonaro e sua família”. Esse sistema de governo não precisa de armas, soldados e torturadores para manter-se no poder. Precisa de uma boa máquina de distorcer a verdade com capilaridade capaz de competir com a imprensa tradicional. Precisa de homens em postos-chave devotos ao presidente e capazes de sabotar o sistema educacional, como é o caso do ministro da Educação, Abraham Weintraub. E de uma pessoa capaz de fazer recuar os avanços dos costumes para a Idade da Pedra, caso de Damares Alves, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Esse modelo de se manter no poder não é de hoje. Ele foi aperfeiçoado pelas novas tecnologias. O seu apogeu foi na década de 30. Aqui no Brasil, com a ditadura de Getúlio Vargas, na Europa, com a Itália de Benito Mussolini e com a Alemanha de Adolf Hitler. Lembram-se do ex-secretário da Cultura Roberto Alvim, demitido por Bolsonaro em janeiro por imitar o ministro da propaganda de Hitler, Joseph Goebbels? De onde ele tirou a ideia? Há vários artigos de estudiosos do assunto disponíveis na internet. Inclusive uma série de documentários chamada Hitler’s Circle of Evil.

Bolsonaro evolui para esse projeto de poder ajudado pelos filhos. Flávio, 38 anos, senador pelo Rio de Janeiro, Carlos, 37, vereador do Rio, e Eduardo, 35, deputado federal por São Paulo, que copiaram a máquina de distorcer a verdade aperfeiçoada pelos americanos nas eleições do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Os generais de Bolsonaro conseguiram segurar no governo o ministro Mandetta. Por entenderem que se trata de unanimidade que a sua permanência na pasta é fundamental no combate ao coronavírus. Eles desgastaram a imagem do presidente. E vão pagar por isso. A máquina de distorcer a verdade colocou-os na sua mira. Aliás, ela atira contra tudo que faz sombra ao prestígio pessoal do presidente, fundamental para a perpetuação deles e dos seus no poder.

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