Quem deve fiscalizar o parlamentar eleito, o seu eleitor ou a imprensa?

Como é o cotidiano dos deputados e senadores ? Foto: Reprodução

Nas eleições deste fim de semana serão eleitos 513 deputados federais, 1.035 estaduais e 27 senadores. Quem irá fiscalizar o cotidiano e o trabalho deles? É sobre esse assunto que vamos conversar. Vamos aos fatos. Alguns anos depois da redemocratização do país, no meio da década de 90, li o artigo de um colunista político que afirmava que os responsáveis pelo baixo rendimento no trabalho dos parlamentares no Congresso Nacional e nas assembleias legislativas eram os eleitores que os elegeram, porque votaram e nunca mais se preocuparam com quem tinham elegido. Nos anos seguintes, saí repetindo o que tinha lido nas minhas matérias. A exemplo do que fizeram os meus colegas. É uma tradição da profissão de jornalista repetir coisas que circulam dentro da redação como se fossem verdades absolutas. Vamos refletir sobre o assunto.

O eleitor tem condições de fiscalizar o trabalho do seu parlamentar? Duvido muito, porque ele terá que vasculhar os sites de controle de presença, de apresentação de projetos e outras plataformas para saber o que o seu parlamentar anda fazendo. Não tem como verificar se essas informações são verdadeiras. Quem tem tempo e paciência para fazer isso? A realidade mostra que a grande maioria dos eleitores tem optado por esquecer o assunto, inclusive o nome do candidato em que votou. E qual é o perfil do parlamentar sobre o qual nós jornalistas costumamos fazer matéria. Os primeiros são os que se metem em confusão, em especial em casos de corrupção e outros eventos exóticos. Em segundo plano estão aqueles que defendem assuntos relevantes para a sociedade ou ocupam cargos importantes na Câmara dos Deputados, no Senado ou nas assembleias legislativas.

E o resto dos parlamentares, que são a grande maioria? Esses ficam por sua conta própria, pouco ou nada se sabe do que fazem do seu mandato. Sobre essa realidade vou chamar a atenção dos colegas jornalistas e leitores para dois pontos que considero importantes. O primeiro deles é que, graças ao desconhecimento dos jornalistas sobre o que acontece no cotidiano da maioria dos parlamentares, aos olhos dos leitores fica parecendo que toda vez que acusamos um deles de estar envolvido em sacanagem estamos nos referindo a todos eles. Graças a isso, a imagem dos políticos perante a opinião pública vem se deteriorando de modo acelerado nas últimas décadas. Essa deterioração é usada por grupos de extrema direita para vender ao grande público a ideia de que são diferentes dos “políticos tradicionais”. Lembro que a negação da política foi a principal bandeira do governo do presidente da República, Jair Bolsonaro (PL). E que deu como resultado uma administração confusa, que causou vários danos à população. Vou citar o mais conhecido deles. O fato do presidente ter transformado em política de governo o seu negacionismo em relação ao poder de contágio e letalidade da Covid. O fato é relatado nas 1,3 mil páginas do relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito do Senado sobre Covid, a CPI da Covid, que colocou as digitais do governo nas 680 mil mortes de brasileiros causadas pelo vírus. O segundo ponto é que as grandes empresas de comunicação não têm dinheiro e muito menos gente para investir na montagem de uma estrutura de cobertura para investigar o cotidiano desse grande contingente de parlamentares que ninguém sabe o que estão fazendo do seu mandato. Essa é a situação. Fazer o quê?

Vejo nessa situação uma oportunidade para os jornalistas se organizarem e montarem um site e começarem a fazer pautas sobre quem são esses parlamentares. Lembro os colegas o seguinte. Antes das novas tecnologias de comunicação disponíveis nos dias atuais não tínhamos dinheiro para montar um negócio. Hoje, com um pequeno investimento é possível tocar um site. Ainda mais sobre esse tipo de assunto, em que as informações podem ser encontradas em abundância nos sites oficiais. Tenho dito nas palestras que faço para estudantes de jornalismo que é preciso ficar atento às oportunidades que as situações nos oferecem para montarmos o nosso próprio negócio. Lembro que quando comecei na profissão, em 1979, havia abundância de empregos nas redações, principalmente para quem tinha nome no mercado. Nos dias atuais não interessa o tamanho e a relevância do currículo do jornalista. Não há emprego. E os que existem pagam mal e exigem do profissional uma carga enorme de trabalho. E o que considero mais importante: as grandes empresas de comunicação não têm dinheiro para investir em grandes reportagens, principalmente as investigativas, que são caríssimas por exigirem viagens e longo tempo de preparação. O dinheiro que têm está priorizado para outro tipo de investimento, como o entretenimento, que não tem nada a ver com o jornalismo. Enquanto isso, os leitores exigem cada vez mais dos jornalistas informações precisas sobre vários assuntos, principalmente nas áreas de política e economia. Portanto, existe uma demanda por melhores informações por parte dos leitores que está sendo deixada de lado pelos grandes jornais. Como se diz no interior do Rio Grande do Sul: “Há um cavalo encilhado passando na nossa porta”.

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