A execução da vereadora e do seu motorista foi um recado para o xerife do Rio de Janeiro

A vereadora virou alvo por defender os interesses dos favelados. Foto: reprodução do arquivo pessoal.

Por conta da intervenção das Forças Armadas, hoje o Rio de Janeiro é o pedaço do Brasil mais vigiado e guarnecido. Por que, dentro de um ambiente desses, uma organização criminosa iria fazer um acerto de contas com a vereadora Marielle Franco (PSOL)? Mais ainda: a ação da vereadora, denunciando as arbitrariedades policiais contra os favelados, vem desde 2013. A execução da parlamentar e do seu motorista Anderson Pedro Gomes traz uma mensagem muito clara: alguém está avisando que ainda manda no Rio Janeiro. E esse nome só irá surgir no final dessa investigação. Por conta da pressão popular e  do número de agentes disponíveis, equipamentos e informações dos serviços de inteligência, a investigação está caminhando bem. A maneira como foi feita a execução e os vestígios deixados na cena do crime apontam na direção de que os assassinos eram profissionais.

E o estilo da execução lembra os milicianos – gangues de policiais militares que disputam território com os traficantes nas favelas. Há ainda outros dois grupos que usam um estilo semelhante: Comando Vermelho (CV), do Rio de Janeiro, e Primeiro Comando da Capital (PCC), de São Paulo. A favor dessas organizações, existe o fato que, sempre que as Forças Armadas ocupam o Rio de Janeiro, e foram muitas vezes na última década, elas não vão para o enfrentamento porque sabem que a ocupação é por tempo limitado. A briga não vale a pena. Esperam as tropas saírem e voltam aos seus negócios. Tem sido assim nos últimos anos. Portanto, é real a possibilidade de que o grupo que executou a vereadora e o seu motorista ter sido formado apenas para fazer “a parada”, usando o jargão dos matadores de aluguel para definir a situação.

Quem apertou o gatilho a polícia vai descobrir. Nós, repórteres, podemos avançar nos lugares escuros desse episódio em busca de pistas de quem é esse alguém que está mandando o aviso de que ainda manda no Rio de Janeiro. Primeiro, é uma pessoa que sabe o que significa o Rio de Janeiro. Um lugar que, por conta de suas belezas naturais, seus poetas, botecos e o carnaval, é um endereço conhecido no mundo. Qualquer coisa que acontece lá é notícia mundial.  A intervenção federal foi noticia ao redor do mundo. Aqui é o seguinte. Até o governo do presidente da República Michel Temer (MDB – SP) decretar intervenção federal no Rio, ele era coadjuvante no combate da violência. A intervenção o tornou o ator principal, ou usando o jargão das redações, puxou a bronca para o seu colo. Quem é o governo Temer? Ele é formado por um grupo político que está envolvido em vários escândalos de corrupção, há vasta documentação na Operação Lava Jato. É um fato importante.  Na medida em que o grupo foi se consolidando no poder, ele vai se livrando de antigos aliados que são abandonados à própria sorte. Muitos deles foram presos e estão encarcerados no sistema penitenciário.

A execução da vereadora é um recado muito claro para Temer: ele manda no Brasil, não no Rio de Janeiro. Aqui quero refletir com os meus colegas repórteres calejados e os novatos. Até agora, as execuções do Rio de Janeiro têm seguido um roteiro conhecido. Elas acontecem por vingança, queima de arquivo ou briga  por território. O caso da vereadora e do seu motorista tem vestígios do que pode ter acontecido por motivos diferentes. Nos últimos 40 anos, tenho trabalhado com reportagem investigativa e aprendi que  as coisas nem sempre são o que aparentam ser. O certo é que a pouca credibilidade que resta ao governo federal pode ir para o espaço com o caso da vereadora. A intervenção  tornou Temer o xerife do Rio de Janeiro, o responsável pela segurança.  E também  criou a oportunidade  para a execução da vereadora que devido ao seu trabalho sempre foi um alvo das gangues infiltradas na polícia militar.

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