Pastor Malafaia saiu da manifestação de Bolsonaro “cantando de galo”

Ausência dos generais ao redor de Bolsonaro vai abalar o seu prestígio político? Foto: Reprodução

O pastor neopentecostal Silas Malafaia, 65 anos, saiu empoderado da manifestação pública feita pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no último domingo (25/02), na Avenida Paulista, região central de São Paulo. Malafaia convenceu Bolsonaro a fazer o ato político para apresentar a sua versão sobre a participação dele na conspiração para a tentativa de golpe de estado de 8 de janeiro de 2023. Pelo roteiro, Malafaia atuaria como uma espécie de boneco de ventríloquo do ex-presidente, que devido aos processos aos quais responde foi recomendado pelos seus advogados a não ofender os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), o governo federal e outras autoridades. No seu discurso, Malafaia não falou por Bolsonaro. Ele encenou, no caminhão de som, a sua versão da história que levou o ex-presidente a se tornar réu da Justiça. A versão foi recheada de citações bíblicas, fake news e lembretes de que já havia alertado Bolsonaro que ele seria vítima da esquerda – há uma abundância de vídeos disponíveis na internet. No final, encheu de desaforos a imprensa. Consta que foi o pastor que organizou e pagou as despesas da manifestação, que reuniu em torno de 200 mil pessoas. Por conta disso, no dia seguinte, segunda-feira (26/02), ele desafiou os fiscais do Imposto de Renda a encontrar irregularidades na suas finanças.

No linguajar atual das redações se dirá que Malafaia saiu empoderado da manifestação. Nos tempos das barulhentas máquinas de escrever e das nuvens de fumaça de cigarro pairando sobre as redações, se diria que ele saiu “cantando de galo”. Ele não é só pastor da igreja Assembleia de Deus em Cristo, é também um dos grandes oradores neopentecostais. A sua rotina de vida tem sido de altos e baixos perante a opinião pública. Atualmente, estava em baixa devido a derrota de Bolsonaro nas eleições presidenciais de 2022. A atuação dele na manifestação o ressuscitou publicamente. Basta ver nas redes sociais a enorme quantidade de posts e outras mensagens. Podemos assim resumir o caso. A situação do ex-presidente perante a Justiça não mudou um milímetro com a manifestação. Continua sendo muito séria. Inclusive, ele correu o risco se complicar ainda mais, caso tivesse dito uma bobagem durante o discurso. Li, vi e ouvi sobre a atual situação jurídica e política do ex-presidente. No campo político ninguém escreveu que ele está encurralado. Por quê? O prestígio de Bolsonaro colocou 200 mil pessoas na Paulista. Não é pouca coisa. Como esse público chegou lá? Foram organizados e tiveram as suas despesas pagas pelas igrejas neopentecostais, especialmente a do pastor Malafaia. O fato é o seguinte. Até esta manifestação, quem dava as cartas para o ex-presidente era Valdemar da Costa Neto, presidente do seu partido. Costa Neto vai dividir a administração do prestígio político de Bolsonaro durante as eleições municipais com o pastor? Uma pergunta que o tempo responderá.

Há uma história sobre o prestígio do ex-presidente que merece uma melhor atenção por parte da imprensa. Uma parte importante do patrimônio político de Bolsonaro deve-se às suas ligações com as Forças Armadas. Lembro que os militares oficialmente nunca estiveram no poder durante o seu governo. Mas, na prática, 6 mil (reformados, da reserva e da ativa) foram trabalhar na administração federal. A maioria como coordenadores de área e ministros. Esse quadro permitiu ao ex-presidente vender para a opinião pública, com grande alarde, a imagem de que as Forças Armadas estavam no poder. Oficialmente, nunca estiveram. As investigações da Polícia Federal (PF) sobre a conspiração do golpe de estado de 8 de janeiro, que acabaram em quebra-quebra em Brasília, apontou o envolvimento de generais e outros oficiais de altas patentes com os conspiradores. Lembro que na durante o governo do ex-presidente havia um grupo que lhe dava suporte político que era chamado pela imprensa de “generais do Bolsonaro”. Entre eles estavam Braga Netto, que foi candidato a vice na chapa da reeleição de Bolsonaro, e Augusto Heleno, ex-ministro-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional da Presidência). Esses dois generais da reserva estão sendo investigados por terem participado da conspiração para o golpe de estado. O atual ministro da Defesa, José Múcio, tem dito que o problema dos militares envolvidos em irregularidades no governo anterior é deles e não tem nada a ver com as corporações. Que impacto terá no prestígio do ex-presidente perante os seus eleitores a definição de que as Forças Armadas não fizeram parte do seu governo e que os oficiais que estavam na sua administração estão entregues à própria sorte?

Arrematando a nossa conversa. A não ser que apareça algum episódio desconhecido sobre a manifestação bolsonarista de domingo, ela deverá cair para o pé da página dos jornais. Mas isso não significa que possa perder o interesse dos repórteres. Muito do que aconteceu vai se refletir no futuro da extrema direita no Brasil. Há episódios que ainda carecem de uma melhor explicação para os leitores. O principal deles é tóxica mistura de religião com política, como está sendo incentivado pelo pastor Malafaia e seus seguidores. Lembro que em vários cantos do país vem acontecendo ataques de neopentecostais a outras religiões, como a umbanda. Uma das heranças do governo do ex-presidente foi a perseguição das religiões afrodescendentes, especialmente na Região Metropolitana de Salvador (BA). A manifestação dos bolsonaristas merece ser melhor esmiuçada para entendermos o que vem por aí. Podem apostar, colegas.

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